Gabriela Pércio
Advogada e Consultora em Licitações e Contratos Administrativos.
Mestre em Gestão de Políticas Públicas.
Vice-presidente do Instituto Nacional da Contratação Pública – INCP.
Sumário: 1. Introdução. 2. Os novos contornos do contrato administrativo. 2.1 O regime de prerrogativas públicas à luz do novo contexto normativo. 2.2 O contrato enquanto instrumento eficaz de gestão pública. 2.3 Os contratos de longo prazo e a problemática dos impactos do tempo na sua execução. 2.4 Os limites às alterações consensuais qualitativas e quantitativas. 3. Conclusão.
- Introdução
Há alguns anos se discute a chamada crise da teoria contratual administrativa.[1] Em breves palavras, pode-se dizer que, ao longo dos anos, a existência de um único regime jurídico contratual[2] mostrou-se inadequada para o alcance dos objetivos de interesse público e a possibilidade do exercício, muitas vezes equivocado, de prerrogativas pela Administração contratante relegou seus potenciais contratantes privados, parceiros naturais de negócios, à posição de oponentes, criando um ambiente de insegurança jurídica, com graves reflexos nos aspectos econômicos do contrato.[3]
Foi neste cenário que, em 2016, a Lei nº 13.303[4], entre outras modificações relevantes, restringiu o exercício de prerrogativas contratuais por tais entidades, cingindo a alteração de seus contratos à existência de acordo entre as partes[5] e tornando necessário o diálogo para chegar ao consenso.[6] A mudança, tida como favorável à eficiência e à economicidade das contratações, foi bem recebida.[7]
Em 2021, a Lei 14.133 não seguiu o mesmo caminho, mantendo o regime de prerrogativas[8] e replicando, em meio a novidades, diversas regras sobre contratos que já eram previstas na Lei 8.666/1993.[9] Não obstante, tal espécie de continuidade não deve ser confundida com ausência de mudanças e, menos ainda, de avanços.
O novo regime jurídico dos contratos administrativos precisa ser estudado e compreendido à luz do microssistema normativo inaugurado pela Lei 14.133/2021 e, especialmente, dos novos arranjos contratuais que passaram a ser possíveis após a sua vigência. É necessário revisar concepções e entendimentos em busca de interpretações que permitam, senão superar, minimizar problemas preexistentes e melhorar o ambiente dos negócios públicos, aumentando a eficiência e a eficácia do contrato administrativo para a consecução dos objetivos de interesse público. As próximas linhas se destinam a trazer reflexões e proposições sobre o assunto, com o objetivo de provocar o debate e instigar conclusões nesse sentido.
- Os novos contornos do contrato administrativo
2.1 O regime de prerrogativas públicas à luz do novo contexto normativo
A manutenção das prerrogativas da Administração Pública contratante no bojo da Lei 14.133/2021 não significa, em absoluto, manutenção do status quo ante. Apesar da semelhança de redação, não significa, nem mesmo, a repetição de normas, mas, apenas e tão somente, a manutenção da relação de verticalidade. Em verdade, a nova Lei contém premissas suficientes para a construção de uma nova relação contratual, mais equilibrada, menos instável, mais eficaz.
Com efeito, o interesse privado passou a ocupar certo protagonismo, reconhecendo-se a sua importância para o negócio jurídico e a importância da sua satisfação para a satisfação do próprio interesse público. Princípios basilares da Teoria Geral dos Contratos foram trazidos para o seu texto, de forma expressa ou implícita, o exercício de prerrogativas foi mitigado e novos espaços para o consenso foram criados[10], num evidente objetivo de melhorar o ambiente de negócios. Nesse sentido:
a) o princípio da segurança jurídica passou a ser um vetor expresso para a aplicação da Lei[11], impondo uma atuação mais previsível por parte da Administração Pública e, com isso, reduzindo a instabilidade;[12]
b) a tolerância para o atraso nos pagamentos devidos[13] e o tempo de suspensão unilateral do contrato pela Administração foram reduzidos[14]; o contratado passou a ter assegurado, expressamente, seu direito à extinção do contrato, em caso de imposições unilaterais que ultrapassem limites legais[15]; em caso de discussões sobre a execução, a parcela incontroversa do pagamento deverá, sempre, ser liberada[16] e a Administração deverá decidir, expressamente, sobre todas as solicitações e reclamações relacionadas à execução dos contratos[17], num evidente prestígio ao interesse privado envolvido;
c) a Administração deverá fixar no contrato prazo para responder pedidos de repactuação e revisão econômica[18] e, em contratos de maior relevância, a matriz de riscos distribuirá, desde logo, justa e racionalmente, os riscos entre as partes[19], proporcionando maior clareza em relação às condições para a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato;
d) conflitos acerca de direitos patrimoniais poderão ser resolvidos mediante a utilização de métodos alternativos de solução de controvérsias[20] e termos de ajustamento de conduta poderão ser celebrados para mitigar a aplicação de sanções[21], permitindo soluções consensuais que sejam eficazes para cada caso concreto.
Também merecem destaque a positivação do dever de planejamento, incluído expressamente entre os princípios que devem ser observados na aplicação da Lei[22], e a indicação explícita dos atos que devem ser praticados na fase preparatória da contratação.[23] Tais disposições ajudarão a mitigar situações que, em tempos passados, levavam à realização de aditivos para alterações unilaterais decorrentes de falhas de planejamento, que além de aumentar a insegurança jurídica para o contratante privado, trazia o risco de punições pelos tribunais de contas. A realização de estudos e avaliações em conformidade com as novas regras, suficientes à perfeita identificação do objeto e das condições de contratação, deverá, conforme se espera, inibir tais espécies de alterações unilaterais e restringir o exercício da prerrogativa pública a situações em que o interesse público vier a sofrer mutações decorrentes de fatos supervenientes e imprevisíveis ao tempo da contratação.
Ainda acerca das alterações unilaterais, outra novidade acarretará mudanças significativas: a intenção de alterar unilateralmente o contrato deverá ser precedida da avaliação do seu impacto econômico nos encargos suportados pelo contratado, promovendo-se, quando for o caso, o reequilíbrio no mesmo termo aditivo.[24] Significa que, além das razões técnicas e do respaldo legal, a instrução do procedimento de alteração unilateral deverá trazer o demonstrativo do seu impacto econômico, sendo, a concessão do reequilíbrio, quando for o caso, condição para a própria alteração. Para as situações de supressão unilateral, a regra é de solar importância, diante da possibilidade de redução significativa da remuneração do contratado em relação às expectativas iniciais. Some-se a isso o “novo” dever da Administração, de ressarcir dispêndios com materiais já adquiridos e indenizar o que mais se comprovar devido[25] e teremos uma clara redução da insegurança relacionada ao exercício dessa prerrogativa pública.
Diante do exposto, verifica-se que a Lei 14.133/2021, de forma inovadora, manteve a verticalidade decorrente da supremacia do interesse público sobre o privado, mas conferiu-lhe uma nova roupagem, reduzindo iniquidades que afetavam negativamente o negócio jurídico e aumentando a proteção econômico-financeira do contratado em face de imposições unilaterais.
2.2 O contrato enquanto instrumento eficaz de gestão pública
Diferentemente da sua antecessora, a Lei 14.133/2021 não traz um conceito para o contrato administrativo, nem trata do contrato privado da Administração Pública[26], deixando, de um modo geral, ao encargo da doutrina a propositura de definições que se relacionem ao contrato administrativo enquanto instituto de Direito, seja sob a perspectiva estrutural, seja sob a perspectiva funcional.[27] Indo por outro viés, sua abordagem é pragmática, tomando o contrato administrativo como instrumento de gestão pública, fixando regras que incrementam a sua funcionalidade, ou seja, a sua capacidade de alcançar os objetivos para os quais foi celebrado.
Nesse sentido:
a) as exigências da fase preparatória deverão resultar em uma modelagem cuidadosa do negócio, que considerará a necessidade administrativa, as soluções oferecidas pelo mercado e os melhores incentivos econômicos para o contratante privado, com impacto direto nos resultados da licitação e do contrato. Em qualquer caso, a Lei exige precisão na identificação da demanda e na definição da solução que poderá satisfazê-la[28]. Sendo mais complexo o interesse público e maiores os riscos envolvidos, o diálogo formal com o setor privado[29], será o caminho para a redução de assimetrias informacionais, a compreensão da melhor forma de obtenção dos resultados pretendidos e a adequada identificação da metodologia de gestão e alocação de riscos contratuais[30], minimizando erros e otimizando acertos;
b) as novas regras sobre a duração dos contratos revelam um racional diferente do adotado pela legislação anterior, aparentemente apto a resolver velhos problemas. Enquanto a Lei 8.666/1993 trazia como regra o contrato anual, sem diferenciar contratos de prazo e de escopo e, especialmente para aqueles, ignorava o impacto do fator tempo no negócio jurídico, a Lei 14.133/2021 fixa regras distintas para ambas as espécies contratuais e traz, para os contratos de escopo, a prorrogação automática da vigência, priorizando a entrega dos resultados em detrimento da preocupação com a extinção do ajuste pelo decurso do tempo.[31] No caso dos contratos de prazo, a Lei reconhece o tempo como um elemento fundamental. O prazo de vigência do contrato deve ser definido de acordo com o tipo de contrato, seu objeto e os impactos da duração do ajuste nos resultados buscados. Ou seja: deve ser avaliado, na fase preparatória da contratação, o potencial do prazo de vigência para influenciar positivamente o negócio jurídico que será realizado, notadamente no que toca aos seus aspectos econômicos. Os levantamentos realizados durante a elaboração do estudo técnico preliminar deverão evidenciar o melhor prazo de vigência e a vantagem da contratação plurianual, se ela existir;[32]
c) a admissibilidade de subcontratação mesmo sem previsão em edital[33] ampliou a eficácia do contrato administrativo já celebrado, diante da possibilidade de, sendo identificada como melhor solução para o interesse público apenas na fase contratual, ainda assim possa acontecer, mediante as devidas justificativas;[34]
d) a não submissão das alterações consensuais a limites percentuais e, consequentemente, a maior flexibilidade para a ocorrência de transações relacionadas aos aspectos qualitativos e quantitativos do objeto integra o conjunto de providências da Lei 14.133/2021 que possibilitarão o melhor aproveitamento do contrato administrativo para o alcance dos objetivos de interesse público nele envolvidos. O assunto é polêmico, razão pela qual será melhor analisado em tópico específico.
2.3 Os contratos de longo prazo e a problemática dos impactos do tempo na sua execução
A possibilidade de celebrar contratos com prazos mais longos traz discussões importantes. Os avanços são evidentes, com a redução da burocracia e, especialmente, modelagens mais econômicas para os contratos[35]. Contudo, é preciso ver além.
Contratos de longo prazo são marcados pela incompletude, sendo impossível antever todas as condições que podem influir sobre ele ao longo de toda a sua vigência.[36] De acordo com a teoria relacional, tais ajustes equivalem a um processo evolutivo e são peculiarizados pelo dinamicismo, pela mutabilidade, pela complexidade e por relações interdependentes e multilaterais. Exigem estruturas de governação que permitam solucionar a multiplicidade de contingências a interferir na sua execução, com uma disciplina contratual endógena prevendo para as partes incentivos, mecanismos e recompensas para uma atuação conjunta, coordenada e consensual na busca das soluções para problemas surgidos após a sua celebração.[37] A mutabilidade, a flexibilidade e a possibilidade de construção de soluções negociadas pelas partes são inerentes a tais contratos, compreendendo-se que a segurança jurídica decorre, exatamente, da certeza da mudança.[38]
No Brasil, estudos sobre o assunto sempre envolveram contratos de concessões e permissões de serviços público, mas a possibilidade, trazida pela Lei 14.133/2021, de celebração de outras espécies contratuais por períodos iniciais mais longos, requer atenção acerca dos impactos do tempo na sua execução[39], considerando que, não sendo tão complexos quanto aqueles, não cabe, contudo, categoriza-los, genericamente, como simples. A peculiaridade do prazo dilatado, pontue-se, pode requerer tratamento distinto e inviabilizar a sua submissão às mesmas regras aplicáveis aos contratos de curta duração, notadamente relacionadas aos limites para a mutabilidade e à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro.[40] Destacam-se, dentre tais contratos, os de fornecimento de bens e prestação de serviços contínuos, que, pela amplitude da definição legal, deverão representar parcela significativa dos contratos celebrados pela Administração Pública e, quando celebrados por prazos superiores a um ano, poderão gerar impasses inéditos ao longo de sua vigência.[41]
2.4 Os limites às alterações consensuais qualitativas e quantitativas
O tratamento dispensado pela Lei 14.133/2021 às alterações contratuais não é o mesmo da legislação anterior.[42] Apesar da semelhança na redação dos principais dispositivos sobre o assunto, uma mudança importantíssima claramente ocorreu e deve ser percebida nas entrelinhas do texto normativo.
No influxo de reduzir a insegurança do regime de prerrogativas, a preocupação evidente é com as alterações unilaterais. Continua sendo vedada a alteração unilateral de cláusulas econômico-financeiras, está mantido o dever de revisar as cláusulas econômico-financeiras do contrato para manutenção do equilíbrio, bem como foram repetidos os limites percentuais, agora abarcando, expressamente, as alterações unilaterais qualitativas e quantitativas. A nova Lei sinaliza, ainda, de forma clara, que as alterações unilaterais não podem transfigurar o objeto da contratação[43].
Contudo, a vedação a “qualquer alteração” que superasse os limites percentuais, salvo as supressões que resultassem de acordo entre as partes[44], presente na Lei 8.666/1993, não foi repetida, revelando maior tolerância para com alterações realizadas de forma consensual, inclusive qualitativas e quantitativas do objeto[45], conclusão que se alinha às demais características do contrato administrativo, sugeridas nos tópicos anteriores.
Assim, em nosso entender, a nova Lei permite, como regra e em tese, ajustes e rearranjos acordados entre as partes,[46] ficando, a legalidade da decisão administrativa, condicionada à análise do caso concreto. Neste contexto, posteriormente à celebração do contrato, as partes poderão realizar ajustes consensuais em razão de fato superveniente e imprevisível, de situações imprevistas constatadas durante a execução ou, ainda, de mutações no interesse público, decorrentes dos efeitos do tempo em contratos de longo prazo. Até mesmo falhas de planejamento por parte da Administração não podem ser excluídas, diante das dificuldades práticas em torno da demonstração, na fase preparatória, da vantagem na celebração de tais ajustes, conforme exigido pela Lei. Incluem-se, ainda, na lista de possíveis objetos de alterações consensuais, o atendimento de demandas legítimas do contratante privado, que não afetem os resultados pretendidos pela Administração Pública contratante e não ofereçam, concretamente, vantagem diversa daquela oferecida na licitação.
Esta premissa parece-nos correta, especialmente por se mostrar fundamental no novo cenário de contratos de longa duração, já desenhado nos tópicos anteriores. Sua manutenção poderá exigir negociações as mais diversas, sempre visando a manutenção da eficácia do contrato para o alcance dos seus objetivos iniciais, públicos e privados, ao longo de todo o período de vigência.
Note-se, ainda, que a ausência de um limite legal expresso de valor evitará que alterações comprovadamente necessárias, mas que ultrapassem o limite percentual, deixem de ser realizadas por receio de questionamentos e eventual responsabilização pelos tribunais de contas.
Sendo assim, de acordo com a nova Lei e com as disposições da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB[47], diante da necessidade de alterações contratuais, especialmente alterações qualitativas e quantitativas do objeto que superem o limite percentual legalmente estabelecido, caberá ao gestor, orientado pelos princípios previstos no art. 5º da Lei 14.133/2021, tomar a melhor decisão para o interesse público à luz das circunstâncias concretas, motivando-a devidamente.
- Conclusão
A Lei 14.133/2021 traz regras que minimizam alguns dos impactos negativos relacionados à verticalidade da relação encerrada nos contratos administrativos e melhoram a eficiência e a eficácia desses ajustes enquanto instrumento para a consecução de objetivos de interesse público. Tal conclusão é possível a partir de uma compreensão do novo texto legal que considera o contexto de mudanças e os avanços que precisam ser concretizados.
Na nova Lei, o contratante privado é um player importante, que busca alcançar objetivos próprios e cujo desempenho é influenciado pelo grau de confiança que possui na Administração Pública, razão pela qual contém dispositivos que asseguram a ele um tratamento mais apropriado e compatível com sua relevância para o negócio. Ainda, a faceta funcional do contrato recebeu maior atenção, ampliando-se o seu potencial de utilidade para a produção de resultados satisfatórios não apenas para o interesse público, mas também, para o privado. Há, portanto, nitidamente, condições para evoluir.
Contudo, a aplicação das novas regras da forma sugerida requer algumas mudanças. Primeiramente, relacionadas ao comportamento de intérpretes e operadores. Aumentar a segurança jurídica e garantir a concretização de impactos econômicos positivos exige uma interpretação moderna do texto legal, que permita a uma Administração Pública respaldada pela nova Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro um atuar mais eficiente e eficaz.
Também é fundamental a revisão, pela Administração Pública, de comportamentos que não se encaixam nesse objetivo de melhorar as relações com o setor privado para melhorar os resultados para o interesse público. Aplicar a nova Lei requer uma atuação mais empática, pautada na consensualidade. É fundamental entender que o poder de realizar imposições unilaterais deve ser exercido de forma excepcional, consciente, útil, racional, eficiente e comedida. Alteração unilateral não implica, obrigatoriamente, em atuação unilateral; ao contrário, a adoção do diálogo para equacionar interesses não só é possível, como devida, além de aumentar as expectativas de uma execução satisfatória.[48] Também devem ser abolidas condutas que, mesmo notoriamente incompatíveis com o ordenamento jurídico, escapam, na maioria das vezes, ao controle dos órgãos competentes, institucionalizando uma cultura de autoritarismo, em prejuízo da lealdade e da boa-fé contratual.[49]
Mudanças estruturais também são necessárias, envolvendo ações coordenadas de governança e gestão das contratações, voltadas para a capacitação e o aperfeiçoamento contínuo de autoridades e agentes que desempenham funções essenciais no processo de contratação e para a construção de um ambiente que proporcione condições senão ótimas, ao menos suficientes para o desempenho das atribuições envolvidas. É fundamental melhorar o conhecimento dos agentes sobre o tema contratos administrativos, inclusive aqueles que atuam na fase preparatória, bem como suprir as notórias deficiências relacionadas à gestão e à fiscalização de contratos.
Enfim, a aplicação da Lei 14.133/2021, de forma a possibilitar avanços nos contratos administrativos, exige uma concertação de vontades e ações que, apesar de desafiadora, se espera ver concretizada em um tempo não muito distante do nosso. Se novos pilares puderem ser edificados como alicerces das relações negociais entre o público e o privado, novos contratos administrativos surgirão, mais eficientes e eficazes.
“Boa é a lei, quando executada com retidão. Isto é: boa será, em havendo no executor a virtude, que no legislador não havia. Porque só a moderação, a inteireza e a eqüidade, no aplicar das más leis, as poderiam, em certa medida, escoimar da impureza, dureza e maldade, que encerrarem. Ou, mais lisa e claramente, se bem o entendo, pretenderia significar o apóstolo das gentes [São Paulo] que mais vale a lei má, quando inexecutada, ou mal executada (para o bem), que a boa lei, sofismada e não observada (contra ele).”
(Rui Barbosa)
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[1]Na importante tese defendida por Fernando Dias Menezes de Almeida, “a evolução rumo a um novo ponto de convergência, especialmente em consequência do aumento da complexidade do fenômeno contratual envolvendo a Administração Pública.” O autor ressalta que o “aumento de complexidade amplifica sua insuficiência como explicação teórica e ainda revela mais nítidas suas inadequações anteriores”, propondo que o ponto de convergência seja “a essência contratual, atentando-se, especialmente, para a distinção entre o regime jurídico criado mediante contrato e o regime jurídico criado legislativamente quanto ao contrato e quanto a seu objeto; e atentando-se também para a distinção fundamental entre situações jurídicas subjetivas e situações jurídicas objetivas”. (MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias. Contrato administrativo. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p. 13).
[2] A exceção dos contratos de permissão e concessão de serviço público, regidos pela Lei 8.987/1992.
[3]Por todos, dado à abrangência da pesquisa realizada para a construção da tese, cita-se a obra “Contratos administrativos e um novo regime jurídico de prerrogativas contratuais na Administração Púbica contemporânea”, de Vivian Lima Lopes Valle (Editora Fórum), que promove crítica ao modelo de autoridade e sugere um novo regime jurídico para os contratos administrativos, pautado, eminentemente, na aplicação subsidiária da autoridade. Segundo a autora: “O enquadramento do contratado como litigante na contemporaneidade evidencia uma relação agressiva e de desconfiança entre Poder Público e contratado. O contratado presume comportamentos imprevisíveis e desrespeito ao contrato pelo Poder Público, agregando esse risco político ao valor de sua proposta. O Poder Público, por sua vez, presume inexecução contratual, imponto autoridade e prerrogativas no contrato mesmo antes de qualquer situação de interesse público justificar a medida. E essa visão do contratado como litigante colide com a lógica de um princípio ético de fidelidade recíproca aos compromissos assumidos. E produz prejuízos ao interesse público em ambos os sentidos” (p. 69).
[4] A referida lei dispõe sobre o regime jurídico das empresas estatais, incluindo licitações e contratos. Na oportunidade da publicação da Lei, houve questionamentos acerca da constitucionalidade da ampliação do escopo do §1º do art. 173 da Constituição Federal, com a aplicação das regras da Lei 13.303/2016 inclusive às empresas estatais prestadoras de serviços públicos. A celeuma acabou arrefecendo, mas vale citar a doutrina de Fabricio Motta, no sentido de que “com o advento da Lei 13.303/16, o legislador simplesmente optou por submeter também essas empresas estatais às mesmas regras aplicáveis àquelas que exploram atividades econômicas em sentido estrito. Pode-se discutir a constitucionalidade dessa opção em um confronto entre as regras específicas e o conteúdo de princípios constitucionais, mas não somente em razão de suposta extrapolação da competência constante do artigo 173.” O trecho foi extraído do artigo “Lei de licitações das estatais peca pelo excesso de regras”, de Fabricio Motta, publicado no CONJUR, disponível pelo link https://www.conjur.com.br/2016-jul-21/interesse-publico-lei-licitacoes-estatais-peca-excesso-regras, acesso em 6.9.2023.
[5] Vide arts. 72 e 81 da Lei 13.303/2016.
[6] BARCELOS, Dawison; TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e contratos nas empresas estatais – Regime licitatório e contratual da Lei 13.303/2016, 2. ed., Salvador: Juspodium, 2020, p. 563.
[7] Nesse sentido, ZYMLER, Benjamin… (et al.). Novo regime jurídico de licitações e contratos das empresas estatais: análise da Lei nº 13.303/2016 segundo a jurisprudência do Tribunal de Contas da União. Belo Horizonte: Fórum, 2018, p. 414. Já Joel de Menezes Niebuhr e Pedro de Menezes Niebuhr manifestaram a preocupação com o risco de que as estatais pudessem “reanimar” a prerrogativa de alteração unilateral em seu favor, autorizando-as, de forma indiscriminada, em seus regulamentos, entendendo que tal conduta é inaceitável (NIEBUHR, Joel de Menezes e NIEBUHR, Pedro de Menezes. Licitações e Contratos das Estatais, Ed. Fórum, 2018, pp. 264-265).
[8] Vide arts. 104 e 124, da Lei 14.133/2021.
[9] Alinhando-se à conclusão de Victor Amorim, considerando as peculiaridades que envolveram a construção da nova Lei, não cabe buscar, para esta e outras escolhas, a intenção do legislador. Segundo o autor, foram “centenas de mãos guiadas pelas mais diversas intenções, pela necessária e salutar participação da sociedade, de segmentos civis e econômicos organizados, de juristas e especialistas em gestão pública”, em um ambiente democrático e participativo durante quase oito anos de processo legislativo em que se sucederam três Legislaturas, três Presidentes da República, um processo de impeachment presidencial e uma renovação parlamentar sem paralelos. E conclui: “não temos sequer um ‘único legislador’, mas vários legisladores, em todas as suas dimensões políticas e temporais.” (AMORIM, Victor. A origem da Nova Lei de Licitações, disponível em https://www.novaleilicitacao.com.br/2022/03/25/a-origem-da-nova-lei-de-licitacoes/ . Acesso em 20.9.203).
[10] Conforme bem destacam PIRONTI e FIGUEROA: “a noção de consensualidade surge como tendência à nova Administração Pública, como meio eficaz de evolução do modelo de gestão e aplicação eficiente e justa do direito.” Ainda, escrevem os autores: “Nesse passo, a transformação do direito se dá exatamente no sentido de que a atuação coercitiva do Estado far-se-á apenas excepcionalmente, ou seja, quando a consensualidade não puder sobrepujar a imperatividade. Dessa forma, a dialogicidade deve imperar nas relações entre o Poder Público e o privado, respeitados, por óbvio, os princípios gerais do Direito e a razoabilidade desse consenso” (PIRONTI, Rodrigo; FIGUEROA, Rodrigo Ochoa. Breve ensaio sobre o consensualismo na Administração Pública e o contraponto entre o modelo burocrático e responsável (“gerencial”) – ano 13 – n. 51 | janeiro/março – 2013 Belo Horizonte | p. 1-310 | ISSN 1516-3210 A&C – R. de Dir. Administrativo & Constitucional).
[11] Vide art. 5º da Lei 14.133/2021.
[12] A observância do princípio da segurança jurídica também deverá reduzir a incidência de custos transacionais, que oneram o preço contratado e não devem, na esteira do que ensinam CAMELO, NÓBREGA e TORRES, ser ignorados pela teoria dos contratos. (CAMELO, Bradson; NÓBREGA, Marcos; TORRES, Ronny Charles Lopes de. Análise econômica das licitações e contratos: de acordo com a Lei 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações). Belo Horizonte. Fórum: 2022, pp. 207 a 221.)
[13] Vide art. 136, §2º, inc. IV, da Lei 14.133/2021.
[14] Vide art. 136, §2º, incs. II e III, da Lei 14.133/2021.
[15] Vide art. 136, caput da Lei 14.133/2021.
[16] Vide art. 143 da Lei 14.133/2021.
[17] Vide art. 123 da Lei 14.133/2021.
[18] Vide art. 92, inc. X e XI e art. 123, da Lei 14.133/2021.
[19] Vide art. 6º, inc. XXVII e art. 22, §3º, da Lei 14.133/2021.
[20] Vide Capítulo XXI da Lei 14.133/2021.
[21] Vide art. 156, §1º, inc. V da Lei 14.133/2021.
[22] Vide art. 5º da Lei 14.133/2021.
[23] Vide art. 18 da Lei 14.133/2021.
[24] Vide art. 130 da Lei 14.133/2021. A medida, em verdade, já era prevista no art. 9º, §2º da Lei 8.987/1995, que regula as concessões e permissões de serviços públicos.
[25] Vide art. 129 da Lei 14.133/2021.
[26]A Lei prevê que não estão submetidos ao seu regime as “contratações sujeitas a legislação própria” (art. 3º, inc. II). A propósito do assunto, Anderson Sant’ana Pedra afirma que a utilização, no inc. II, do art. 3º da Lei 14.133/2021, de redação com largo espectro teve o propósito de alcançar “situações supervenientes que sejam apresentadas por inovações legislativas”. Ao tratar dos contratos privados da Administração pública, o autor defende que eles recebem “influxo das normas de direito público, mas não das regras da NLLCA, podendo adotar modelos negociais mais flexíveis, de acordo com a regra de mercado”. (PEDRA, Anderson Sant’anna. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos – Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021. Cristiana Fortini, Rafael Sérgio Lima de Oliveira e Tatiana Camarão (Coord). Fórum, 2022, p. 60.) Para Luciano Ferraz, permanece vigente a dicotomia entre contratos administrativos em sentido estrito e contratos privados da Administração Pública, com certa flexibilidade na construção das cláusulas contratuais nos casos em que o objeto, a finalidade e o objetivo do contrato revelem a necessidade de regência pelas normas de direito privado, sob pena de onerosidade excessiva ou prejuízo à livre concorrência (Palestra proferida no webinar “As regras relacionadas aos contratos administrativos na nova Lei de Licitações”, promovido pela Fundação Getúlio Vargas, disponível em https://www.youtube.com/watch?v=nBzx9CZ1oVk , acesso em 21.9.2023.)
[27] Fernando Dias Menezes de Almeida destaca as diferenças entre a perspectiva estrutural e a perspectiva funcional de análise jurídica, explorada por Norberto Bobbio, esclarecendo não haver, entre elas, certa ou errada, tendo, ambas, relevância e sentido. Especialmente no tocante à análise do contrato sob a perspectiva funcional, esclarece, com base em Bobbio, a necessidade primária de uma resposta à pergunta “função em relação a que”. Sob qualquer das perspectivas, segundo o autor, devem ser identificados os elementos substanciais do contrato, compreensão que se mostra relevante, por exemplo, no momento de se admitir a não essencialidade do regime de prerrogativas do contrato administrativo ante a necessidade de atendimento do interesse público, preservada a substância do contrato. (MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias. Contrato Administrativo. São Paulo: Quartier Latin, 2012, pp. 64 a 68).
[28] O que não significa, em absoluto, burocratização do procedimento, diante da necessidade de observar, para a aplicação da Lei, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, nos termos de seu art. 5º.
[29] Nesta etapa do processo de contratação, poderão ser realizadas audiência e consulta públicas, conforme estabelece o art. 21 da Lei 14.133/2021.
[30] A modalidade diálogo competitivo será cabível em situações específicas, conforme dispõe o art. 32.
[31] Vide art. 111 da Lei 14.133/2021.
[32] Vide Capítulo V da Lei 14.133/2021, em especial seus arts. 105, 106 e 107.
[33] Vide art. 22, §2º da Lei 14.133/2021.
[34] A possibilidade já era admitida pelo Tribunal de Contas da União. Nesse sentido, o Acórdão nº 3.334/2025, do Plenário: “A subcontratação parcial de serviços contratados não necessita ter expressa previsão no edital ou no contrato, bastando apenas que não haja expressa vedação nesses instrumentos, entendimento que se deriva do art. 72 da Lei 8.666/1993 e do fato de que, na maioria dos casos, a possibilidade de subcontratação deve atender a uma conveniência da administração.”
[35] Sobre a duração dos contratos na Lei 14.133/2021, vide FORTINI, Cristiana e STROPPA, Christianne de Carvalho. A duração dos contratos na lei nº 14.133/2021: o que muda, por que muda e a polêmica em torno dos contratos de prestação/fornecimento. SLC – Soluções em Licitações e Contratos. Soluções Autorais. Março. 2022, p. 51-54.
[36] Nesses casos, especialmente em operações econômicas complexas, marcadas também pela incerteza, as partes podem decidir firmar o contrato sem a alocação dos riscos ex ante, preferindo proceder à gestão negativa de riscos e deixar para momento futuro a decisão quanto a sua alocação, adaptando a solução à nova realidade contratual (MONTEIRO, Paula Greco. Os contratos incompletos e a soft law. Revista dos Tribunais. Vol. 966. Abril de 2016).
[37] Conforme GARCIA, Flávio Amaral. Op. cit. p. 109. O autor ainda escreve que “para a concepção relacional dos contratos vislumbram-se benefícios recíprocos às partes quando estas adotam uma postura baseada na cooperação, na confiança e na boa-fé como elementos centrais na construção coordenada das soluções pós-contratuais da relação duradoura. Os interesses das partes contratantes não assumem necessariamente feições contrapostas. O interesse comum na consecução o objeto do contrato deve leva-las a agir pautadas por padrões cooperativos e solidários.” (pp. 109 e 110.)
[38] MOREIRA, Egon Bockmann. Direito das Concessões de Serviços Públicos – Inteligência da lei nº 8.987/1995 – Parte Geral. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 37.
[39] Segundo ensinam CAMELLO, NÓBREGA e TORRES (ob e p. cit), a “introdução da dinâmica do tempo dá um novo peso a dois elementos-chave dos contratos: compromisso e renegociação”.
[40] A propósito do assunto, NÓBREGA, VERA e TUROLLA já concluíram, quanto aos contratos de infraestrutura, que “a contratação incompleta em um ambiente institucional imperfeito é perfeitamente possível desde que haja uma predisposição a comportamentos pós-contratuais não autômatos, o que se relaciona, por exemplo, às atitudes dos agentes contratuais (Concessionário e Concedente) diante do temor da aceitação dos acordos pelas instâncias de controle do contrato. Muitas vezes, os agentes públicos e privados não se movem por antecipar uma resposta negativa desses agentes de controle, por temerem o seu formalismo ou até mesmo o seu apego aos institutos da contratação de curto prazo que não fariam sentido na contratação a longo prazo.” (NÓBREGA, Marcos; VERAS, Rafael e TUROLLA, Frederico. Contratação incompleta de projetos de infraestrutura. PSP Hub – WORKING PAPER PSPHUB#002 – Infraestructure and Urbanism Studies – 9 de julho de 2023 – Versão 3).
[41]A extinção unilateral antecipada desses contratos sem ônus para a Administração, prevista no inc. III do art. 106, já desponta como um aspecto preocupante para a efetividade da solução aventada pela Lei, que mira na vantagem das contratações por prazos mais longos.
[42] Abordamos esse assunto com maior profundidade no episódio 23 do podcast Reverbere, do Portal L & C, disponível em https://www.youtube.com/watch?v=V33f6kxbbZw&t=13s .
[43] Vide art. 126, da Lei 14.133/2021.
[44]O §2º do art. 65 da Lei 8.666/1993 estabelecia:
“§2º Nenhum acréscimo ou supressão poderá exceder os limites estabelecidos no parágrafo anterior, salvo: (…)
II – as supressões resultantes de acordo celebrado entre os contratantes.”
[45] Registre-se, sobre o assunto, o entendimento de José Anacleto Abduch Santos: “A regra do art. 125 da Lei nº 14.133/21 propicia ampla margem de discussão. Mas, é inegável, o legislador excluiu as alterações contratuais consensuais de qualquer limite percentual em relação ao valor inicial do contrato atualizado.
Sugere-se uma interpretação da norma à luz dos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da segurança jurídica.
Não parece razoável ou proporcional, ou juridicamente seguro, admitir que uma alteração contratual consensual possa produzir acréscimos ou supressões em montante tal que desnature o contrato original.
Não é correto, igualmente, que uma alteração contratual produza um resultado que, se tivesse sido previsto no processo licitatório, poderia ter atraído potenciais licitantes diversos – modificando significativamente o universo concorrencial original.
Uma interpretação segura indica que, diante da omissão legal no que tange a limites percentuais para as alterações consensuais, sejam elas realizadas apenas no montante necessário, e justificado, para adaptações da execução do contrato ao interesse efetivo e legítimo da Administração, ainda que superiores àqueles limites previstos no art. 125.” (SANTOS, José Anacleto Abduch. Alterações contratuais na nova Lei de Licitações, disponível em https://zenite.blog.br/alteracoes-contratuais-na-nova-lei-de-licitacoes/?doing_wp_cron=1693422710.0237889289855957031250, acesso em 30.8.2023)
[46] Destaca-se, aliás, que mesmo no regime anterior, a possibilidade de realizar alterações consensuais em hipóteses diferentes das legalmente enumeradas era defendida pela doutrina. Marçal Justen Filho já ensinava que o fato de o regime de direito público autorizar a Administração contratante a realizar imposições unilaterais não afasta a possibilidade de modificações bilaterais e consensuais que não trouxerem risco de lesão ao interesse público (JUSTEN FILHO, Marçal. Considerações acerca da modificação subjetiva dos contratos administrativos. In: BACELLAR FILHO, Romeu Felipe (Coord.) Direito administrativo contemporâneo. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 198). Da mesma forma, o Tribunal de Contas da União admitia a modalidade consensual de alterações qualitativas, a despeito da ausência de previsão legal (Decisão 215/1999-TCU/Plenário).
[47] Vide art. 5º da Lei 14.133/2021.
[48]Flávio Amaral Garcia ensina que “a mutabilidade, na sua acepção mais ampla, dever ser permanentemente orientada por uma dinâmica dialética, sempre com o intuito de aumentar o grau de consensualidade nas decisões de alteração do contrato, mesmo aquelas que possam ser unilateralmente definidas pelo poder concedente.
Para tanto, a compreensão e que o concessionário não é um adversário, mas um parceiro colaborador da Administração Pública, é imprescindível no processamento de qualquer alteração contratual. Romper com a lógica antagonista e adversarial que, tradicionalmente, opõe Estado e particular é determinante para o êxito do contrato de concessão e da própria mutabilidade.
Essa percepção decorre, igualmente, da consciência de que existe uma interdependência intrínseca nas obrigações de ambas as partes e que as eventuais alterações contratuais serão mais bem funcionalizadas quando as partes estiverem verdadeiramente imbuídas do intuito de estabelecer um diálogo na busca da melhor solução possível.” (GARCIA, Flávio Amaral. A mutabilidade nos contratos de concessão. São Paulo: Malheiros, 2021, p. 83).
[49] O exemplo mais gritante é o atraso nos pagamentos devidos. Embora configure infração contratual, não há, na prática, meios suficientes a disposição do contratante privado, para forçar a Administração Pública a realiza-lo dentro do prazo ou, em caso de atraso, pagar com a atualização monetária devida.
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