Arbitragem nas contratações públicas

27 de maio de 2022

Rafael Carvalho Rezende Oliveira

Pós-Doutor pela Fordham University School of Law (Nova York). Doutor em Direito pela UVA-RJ. Mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC-RJ. Especialista em Direito do Estado pela UERJ. Professor Titular de Direito Administrativo do IBMEC. Professor do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito – Mestrado e Doutorado do PPGD/UVA. Professor do Mestrado Acadêmico em Direito da Universidade Cândido Mendes. Professor de Direito Administrativo da EMERJ e do curso FORUM. Professor dos cursos de Pós-Graduação da FGV e Cândido Mendes. Membro do Instituto de Direito Administrativo do Estado do Rio de Janeiro (IDAERJ). Presidente do Conselho editorial interno da Revista Brasileira de Alternative Dispute Resolution (RBADR). Membro da lista de árbitros do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA). Ex-Defensor Público Federal. Procurador do Município do Rio de Janeiro. Sócio-fundador do escritório Rafael Oliveira Advogados Associados. Árbitro e consultor jurídico. E-mail: contato@roaa.adv.br.

Resumo: O presente artigo pretende apresentar e debater os principais desafios sobre a utilização da arbitragem nos contratos da Administração Pública.

 

Palavras-chave: Arbitragem. Administração Pública. Contratos públicos.

 

ABSTRACT: This article intends to present and discuss the main challenges regarding the use of arbitration in Public Administration contracts.

 

KEYWORDS: Arbitration. Public administration. Public contracts.

Sumário: 1. Introdução; 2. Mecanismos de resolução de conflitos administrativos: negociação, mediação, arbitragem e os dispute boards; 3. A superação dos obstáculos tradicionais à arbitragem na Administração Pública; 3.1. A releitura do princípio da legalidade, eficiência e juridicidade; 3.2. A interpretação adequada do princípio da indisponibilidade do interesse público no âmbito da Administração Pública Democrática e Consensual; 3.3. O princípio da publicidade e a confidencialidade na arbitragem: uma conciliação necessária; 3.4. Críticas e vantagens da arbitragem na Administração Pública; 4. Desafios na utilização da arbitragem nos contratos da Administração Pública após a Lei 13.129/2015; 4.1. Arbitrabilidade subjetiva (Administração Pública) e objetiva (direitos disponíveis); 4.2. Arbitragem de direito e a vedação da arbitragem por equidade; 4.3. A publicidade da arbitragem na Administração Pública; 4.4. Regulamentação e autonomia federativa; 4.5. Cláusula compromissória e compromisso arbitral; 4.6. Arbitragem e a relativização prerrogativas administrativas; 4.7. Arbitragem ad hoc ou institucional; 4.8. Árbitro ou tribunal arbitral; 4.9. Escolha do árbitro ou instituição arbitral: inexigibilidade de licitação 5. Conclusões

  1. Introdução

A utilização da arbitragem pela Administração Pública não era expressamente prevista na redação original da Lei 9.307/1996 (Lei de Arbitragem), o que gerava debates doutrinários sobre a juridicidade da arbitragem nos contratos da Administração.

Todavia, a Lei 13.129/2015, alterou a Lei de Arbitragem para estabelecer, de forma expressa, que a Administração Pública, direta e indireta, por meio da autoridade competente para realização de acordos e transações, poderá estabelecer convenção de arbitragem de direito (e não por equidade) para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis, respeitado o princípio da publicidade (art. 1.º, § 1.º e § 2.º e art. 2.º, § 3.º, da Lei 9.307/1996).

Além de previsões legislativas específicas, a utilização da arbitragem e de outros meios alternativos (ou adequados) de prevenção e resolução de controvérsias, notadamente, a conciliação, a mediação e o comitê de resolução de disputas foram previstas no art. 151 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações).

Não obstante o relevante avanço da referida alteração legislativa na busca por maior segurança jurídica, permanecem alguns desafios na utilização da arbitragem no âmbito da Administração Pública, conforme será aprofundado a seguir.

  1. Mecanismos de resolução de conflitos administrativos: negociação, mediação, arbitragem e os dispute boards

Inicialmente, é importante destacar que a arbitragem revela importante instrumento de resolução extrajudicial de conflitos.

Destacam-se, como principais métodos alternativos ao Poder Judiciário de solução de conflitos (Alternative Dispute Resolution – ADR’s), a negociação, a mediação, a conciliação e a arbitragem.

A negociação, a mediação e a conciliação são formas de autocomposição de conflitos, uma vez que as partes, com ou sem o auxílio de terceiro, solucionarão suas controvérsias.

Na negociação, as próprias partes buscam a solução do conflito, sem a participação de terceiros.

Em relação à mediação e à conciliação, a diferença entre os instrumentos é tênue. Enquanto na mediação, o mediador, neutro e imparcial, auxilia as partes na composição do conflito, na conciliação, o conciliador, mantida a neutralidade e imparcialidade, pode exercer papel mais ativo na condução do diálogo, apresentação de sugestões e na busca pelo acordo.[1]

A arbitragem, por sua vez, representa forma de heterocomposição de conflitos, pois o terceiro, expert e imparcial (árbitro), por convenção privada das partes envolvidas, decide o conflito e não o Estado-juiz.[2]

A doutrina diverge sobre a natureza jurídica da arbitragem, sendo possível, mencionar três entendimentos: a) contratual ou privatista: sustenta a natureza contratual da arbitragem, pois a sua instituição e os poderes do árbitro dependem da manifestação de vontade das partes;[3] b) jurisdicional ou publicista: defende a natureza jurisdicional do processo arbitral, uma vez que os árbitros são juízes de fato e de direito que solucionam conflitos de interesse, cuja decisão não está sujeita à homologação do Judiciário;[4] e c) intermediária ou mista: ao lado da autonomia de vontade das partes na instituição e na definição da extensão da arbitragem, destaca o seu caráter público, mas não estatal, no processo de solução e pacificação de conflitos.[5]

Além dos métodos tradicionais de resolução de conflitos, é possível mencionar, ainda, os dispute boards, utilizados de forma pioneira nos Estados Unidos na década de 70, durante a construção do Eisenhower Tunnel no Colorado. O dispute board, também conhecido como Comitê de Resolução de Conflitos, pode ser considerado órgão colegiado, geralmente formado por três experts, indicados pelas partes no momento da celebração do contrato, que tem por objetivo acompanhar a sua execução, com poderes para emitir recomendações e/ou decisões, conforme o caso.[6]

A principal diferença entre a arbitragem e os disputes boards está no fato de que, no primeiro caso, a disputa será submetida ao árbitro, que não integra ou acompanha a execução do contrato, e, no segundo caso, a controvérsia será dirimida pelo colegiado de experts, que integra a relação contratual e acompanha a sua execução, com melhores condições, em tese, de prevenir e solucionar problemas, em virtude da redução da assimetria de informações e da celeridade da decisão.

Os disputes boards, apesar da reduzida utilização no Brasil,[7] podem representar um importante instrumento de solução de controvérsias, especialmente nos contratos de grande vulto econômico e complexidade da Administração Pública, tal como ocorre, por exemplo, nos contratos de infraestrutura.

Em 2015, três diplomas legais confirmaram a tendência na utilização de mecanismos extrajudiciais de solução de conflitos e pacificação social. Ao lado da Lei 13.105/2015, que instituiu o novo CPC e estabeleceu a arbitragem, a conciliação e a mediação como importantes instrumentos de solução de controvérsias (art. 3º, §§§ 1º, 2º e 3º) , vale destacar, também, a Lei 13.129/2015 e a Lei 13.140/2015, que trataram, respectivamente, da arbitragem e da mediação nas relações envolvendo a Administração Pública.

No mesmo sentido, o art. 151 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações) estabeleceu a possibilidade de utilização de meios alternativos (ou adequados) de prevenção e resolução de controvérsias, notadamente, a conciliação, a mediação, o comitê de resolução e a arbitragem.

No presente ensaio, destacaremos a utilização da arbitragem nas relações contratuais administrativas.

  1. A superação dos obstáculos tradicionais à arbitragem na Administração Pública

Não obstante a constitucionalidade da arbitragem tenha sido declarada pelo STF,[8] por ausência de violação ao art. 5º, XXXV da CRFB, permaneceu o debate sobre a sua viabilidade jurídica nas relações jurídico-administrativas.

O STF, em precedente anterior à Constituição (caso Lage), admitiu a arbitragem em relações fazendárias.[9] Por outro lado, o STJ, ao tratar de contratos celebrados por empresas estatais, admitiu a utilização da arbitragem nos respectivos ajustes.[10] O TCU, em algumas oportunidades, afirmou que a utilização da arbitragem nos contratos administrativos, sem previsão legal específica, violaria o princípio da indisponibilidade do interesse público.[11]

Em resumo, é possível encontrar, ao menos, três obstáculos tradicionais à arbitragem nos contratos da Administração Pública: a) princípio da legalidade; b) indisponibilidade do interesse público; e c) princípio da publicidade, que iria de encontro à confidencialidade, típica da arbitragem.[12]

Conforme será demonstrado a seguir, os referidos obstáculos são apenas aparentes e não inviabilizam a arbitragem na Administração.

3.1. A releitura do princípio da legalidade, eficiência e juridicidade

            O primeiro obstáculo normalmente apresentado à arbitragem nos contratos da Administração refere-se à ausência de autorização expressa na Lei de Arbitragem.

            Trata-se de tese apoiada na interpretação tradicional e liberal do princípio da legalidade administrativa, segundo a qual a Administração Pública somente pode fazer o que a lei autoriza.

Todavia, o princípio da legalidade deve ser reinterpretado a partir do fenômeno da constitucionalização do Direito Administrativo, com a relativização da concepção da vinculação positiva do administrador à lei.

Em primeiro lugar, não é possível conceber a atividade administrativa como mera executora mecânica da lei, sem qualquer papel criativo por parte do aplicador do Direito, sob pena de se tornar desnecessária a atividade regulamentar. A aplicação da lei, tanto pelo juiz como pela Administração Pública, depende de um processo criativo-interpretativo, sendo inviável a existência de lei exaustiva o bastante que dispense o papel criativo do operador do Direito. De fato, o que pode variar é o grau de liberdade conferida pela norma jurídica.[13]

Ademais, com a crise da concepção liberal do princípio da legalidade e o advento do Pós-positivismo, a atuação administrativa deve ser pautada não apenas pelo cumprimento da lei, mas também pelo respeito aos princípios constitucionais, com o objetivo de efetivar os direitos fundamentais.

Desta forma, a legalidade não é o único parâmetro da ação estatal que deve se conformar às demais normas consagradas no ordenamento jurídico. A legalidade encontra-se inserida no denominado princípio da juridicidade que exige a submissão da atuação administrativa à lei e ao Direito (art. 2.º, parágrafo único, I, da Lei 9.784/1999). Em vez de simples adequação da atuação administrativa a uma lei específica, exige-se a compatibilidade dessa atuação com o chamado “bloco de legalidade”.[14]

O princípio da juridicidade confere maior importância ao Direito como um todo, daí derivando a obrigação de se respeitar, inclusive, a noção de legitimidade do Direito. A atuação da Administração Pública deve nortear-se pela efetividade da Constituição e deve pautar-se pelos parâmetros da legalidade e da legitimidade, intrínsecos ao Estado Democrático de Direito.

No tocante à arbitragem na Administração Pública, sempre sustentamos que a ausência de previsão expressa na Lei de Arbitragem não inviabilizaria a utilização desse mecanismo de solução de controvérsias, especialmente por permitir a melhor efetivação do princípio da eficiência.[15]

No campo das contratações estatais, a arbitragem em contratos privados da Administração Pública (ex.: contratos celebrados por empresas estatais, contratos de locação em que a Administração é locatária) sempre contou com maior aceitação da doutrina e da jurisprudência, especialmente em razão da preponderância da aplicação do regime jurídico de direito privado e pela ausência, em regra, das cláusulas exorbitantes, na forma do art. 62, § 3.º, I, da Lei 8.666/1993.

Todavia, mesmo nos contratos administrativos, a arbitragem representa uma solução eficiente para solução de controvérsias contratuais que digam respeito às questões predominantemente patrimoniais ou técnicas (direitos disponíveis).

Tanto é verdade que a arbitragem em contratos administrativos já contava com previsão em diplomas legais específicos (ex.: art. 5º, parágrafo único, da Lei 5.662/1971, art. 5º art. 23-A da Lei 8.987/1995, art. 93, XV, da Lei nº 9.472/1997, art. 43, X, da Lei nº 9.478/1997, art. 35, XVI, da Lei nº 10.233/2001, art. 11, III, da Lei 11.079/2004).

Conforme afirmado anteriormente, a nosso ver, a ausência de lei, com a previsão de utilização ampla da arbitragem em todos os contratos administrativos, não era fator impeditivo para sua efetivação, uma vez que o art. 54 da Lei 8.666/1993 determina a aplicação supletiva dos princípios da teoria geral dos contratos e das disposições de direito privado aos contratos administrativos.

É inerente ao contrato administrativo a possibilidade de sua extinção antes do advento do termo final, por razões de interesse público, por inadimplemento das partes ou por outras razões previstas em lei, sendo razoável admitir que o poder público, apoiado no princípio da eficiência administrativa e no princípio da boa administração, estabeleça cláusula arbitral para solução eficiente (técnica e célere) das controvérsias contratuais.

Registre-se, também, que o art. 55, § 2º da Lei 8.666/1993, ao exigir a estipulação de “cláusula que declare competente o foro da sede da Administração para dirimir qualquer questão contratual”, não impede a pactuação da arbitragem.[16]

Em verdade, a referida norma não exige que todas as controvérsias sejam dirimidas pelo Judiciário, mas apenas prevê a cláusula de eleição de foro, mesmo porque a arbitragem não afasta, de forma absoluta, a via jurisdicional (ex.: arts. 6º, parágrafo único; 11, parágrafo único; 13, § 2º; 20, §§ 1º e 2º; 22-A, 22-C, 33). Em suma: a cláusula de eleição de foro não é incompatível com a cláusula arbitral.[17]

A utilização da arbitragem, por certo, produziria consequências positivas para as partes contratantes, especialmente por permitir que as disputas contratuais, que envolvem interesses disponíveis, sejam solucionadas por meio de juízos técnicos, oriundos de árbitros escolhidos pelas partes, e em espaço reduzido de tempo.

Em nossa opinião, a previsão genérica da utilização da arbitragem por pessoas capazes, constante da redação originária da Lei de Arbitragem, já legitimava, portanto, a adoção do instituto pela Administração.

Com a promulgação da Lei 13.129/2015, que inseriu o § 1º no art. 1º da Lei 9.307/1996, a discussão em torno da arbitragem no bojo do Poder Público perdeu força, uma vez que a referida norma passou a prever, de forma ampla, a utilização da arbitragem pela Administração Pública direta e indireta para resolução de conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis.

Em reforço à segurança jurídica na utilização da arbitragem nas relações público-privadas, os arts. 151 a 154 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações) também admitem a utilização da arbitragem nas contratações públicas.

3.2. A interpretação adequada do princípio da indisponibilidade do interesse público no âmbito da Administração Pública Democrática e Consensual

            Outro obstáculo normalmente apresentado à arbitragem na Administração Pública seria o princípio da indisponibilidade do interesse público.

Contra a possibilidade de previsão contratual da arbitragem, argumenta-se, por exemplo, que não seria lícito ao particular (árbitro) decidir sobre o correto atendimento do interesse público inerente ao contrato da administração, cabendo ao agente público a interpretação sobre a correta aplicação da lei.

Contudo, a interpretação adequada do referido princípio demonstra a compatibilidade da arbitragem nas relações jurídicas estatais.

No âmbito de uma sociedade plural e democrática, é natural a existência de interesses públicos diversos e, eventualmente, colidentes, cuja aplicação depende da ponderação de interesses, o que justifica a disposição de determinados interesses em detrimento de outros.

Desta forma, o processo de interpretação e aplicação das normas jurídicas pelos agentes públicos envolve, em certa medida, disposição de interesses públicos.

E isso se dá porque, em verdade, nunca existiu um único “interesse público” e nem, tampouco, um interesse privado, concebidos abstratamente e de forma cerrada. Muito ao contrário, em uma sociedade pluralista, existem diversos interesses públicos e privados em constante conexão, de modo que, naturalmente, poderão emergir eventuais conflitos entre interesses considerados públicos (ex: a criação de uma hidrelétrica e a necessidade de desmatamento de área florestal de conservação permanente), entre interesses denominados privados (ex: o direito à intimidade e o direito à liberdade de expressão) e entre interesses públicos e privados (ex: a servidão administrativa de passagem estabelecida em imóvel particular para utilização de ambulâncias de determinado nosocômio público).

No âmbito do Estado Democrático de Direito, a Administração Pública é caracterizada pelo consensualismo na determinação e na efetivação das finalidades públicas. Supera-se o modelo liberal “agressivo” de atuação da Administração por mecanismos consensuais de satisfação do interesse público.[18]

Em consequência, na eterna tensão entre autoridade e liberdade, a Administração Pública passa a atuar de forma mais concertada com os interesses da sociedade, evitando o uso da coerção e prestigiando o uso do consenso, da participação dos administrados nas decisões públicas.

Em vez de impor unilateralmente a sua vontade aos particulares, a Administração Pública deve buscar, na medida do possível, o diálogo com os destinatários da decisão administrativa. Trata-se da substituição da “Administração autoritária” por uma “Administração consensual”. A Administração Pública, com essa nova fisionomia, deixa de lado os atos unilaterais de imposição e passa a se utilizar de instrumentos consensuais, como os contratos, para a satisfação das necessidades públicas.[19]

Por esta razão, proliferam os instrumentos de parcerias entre a Administração Pública e os particulares (ex.: contratos, contratos de gestão, termos de fomento, termos de colaboração etc).

Em síntese, a própria celebração de acordos, em sentido amplo, pela Administração Pública envolve, naturalmente, a disposição de interesses públicos, com a definição do caminho mais adequado para satisfação do interesse público por meio das cláusulas pactuadas.[20]

Ainda que a arbitragem envolva a submissão do conflito contratual à decisão do árbitro, terceiro imparcial em relação às partes contratantes (heterecomposição de conflitos), não se pode olvidar a existência da base consensual no acordo que submete determinada avença à arbitragem.[21]

É inerente, no campo da contratação pública, que a Administração tenha certa margem de liberdade para definir, inclusive, a melhor forma de solução das possíveis controvérsias que poderão surgir em seus contratos, abrindo-se caminho para o processo arbitral ao invés do processo judicial.

Não se trata de dispor do interesse público para satisfazer outra categoria de interesse, mas de definir o melhor caminho para atender o interesse público previamente definido nas cláusulas contratuais.[22] Vale dizer: o interesse público já foi definido e disposto previamente pelo Estado e em ordem decrescente de abstração: Constituição, lei, atos regulamentares e ato administrativo individual/contratos.

O árbitro não dispõe sobre o interesse público, mas se o contrato foi cumprido corretamente ou não pelas partes.

A arbitragem, portanto, não se opõe ao interesse público; ao contrário, o instituto pode ser o caminho para o melhor atendimento do interesse público ao garantir a solução de base consensual e eficiente.

 3.3. O princípio da publicidade e a confidencialidade na arbitragem: uma conciliação necessária

            Por fim, outro óbice tradicional à arbitragem nas relações administrativas é o princípio da publicidade, consagrado no art. 37, caput, da CRFB, uma vez que as arbitragens são, normalmente, submetidas à confidencialidade.

Ocorre que a publicidade, em nosso sentir, não inviabiliza a utilização da arbitragem nas contratações públicas.

Em primeiro lugar, a confidencialidade, ainda que seja comum nas arbitragens, não constitui característica obrigatória e impositiva do procedimento arbitral.

A própria utilização da arbitragem depende, como visto anteriormente, do prévio consenso das partes, que podem preferir a via arbitral, ainda que haja a publicidade do procedimento, o que aconteceria, de qualquer forma, na via judicial. Nesse caso, as decisões, o julgamento e os demais atos praticados devem ser públicos e transparentes.[23]

Em segundo lugar, o princípio constitucional da publicidade não impede o sigilo de documentos ou procedimentos em casos excepcionais. É o que ocorre, por exemplo, nos próprios processos judiciais, submetidos ao segredo de Justiça, bem como em relação aos documentos respaldados pelo sigilo e/ou reserva de jurisdição.

Registre-se, neste ponto, que a Lei 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação – LAI), permite o sigilo em duas hipóteses: a) informações classificadas como sigilosas, consideradas imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado (art. 23); e b) informações pessoais relacionadas à intimidade, vida privada, honra e imagem (art. 31).

Em consequencia, a publicidade na arbitragem envolvendo a Administração Pública não afasta a confidencialidade e o sigilo de atos e documentos que possam colocar em risco a segurança da sociedade ou do Estado ou que envolvam informações pessoais relacionadas à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas.

3.4. Críticas e vantagens da arbitragem na Administração Pública

            Conforme destacado nos tópicos anteriores, a arbitragem na Administração Pública encontra respaldo no ordenamento jurídico, o que foi ratificado pelo art. 1º, § 1º, da Lei de Arbitragem, alterado pela Lei 13.129/2015, e pelo art. 151 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações).

Isto não significa dizer que a utilização da arbitragem nas relações estatais seja imune às críticas. Em resumo, as principais desvantagens seriam: a) receio quanto à independência dos árbitros e possível tratamento preferencial aos interesses privados em detrimento dos interesses públicos; b) inexistência de mecanismos institucionais de garantia de “coerência jurisprudencial”, com a prolação de decisões diferentes para casos semelhantes; e c) déficit de responsabilidade democrática (accountability).[24]

Entendemos, no entanto, que as referidas críticas não possuem o condão de inviabilizar a arbitragem nas relações estatais. Quanto à independência do árbitro, além de inexistir dados concretos que demonstrem a tendência ao tratamento preferencial aos interesses privados em relação aos interesses públicos ou a maior independência de magistrados em relação aos árbitros, certo é que a imparcialidade do árbitro seria garantida por meio do consenso das partes na sua escolha. No tocante à ausência de “coerência jurisprudencial”, esse fator deve ser sopesado pelas partes no momento em que decidirem submeter a questão à arbitragem, mas, de qualquer forma, o árbitro não deve desconsiderar a legislação e a jurisprudência dominante, especialmente dos tribunais superiores. Por fim, em relação ao déficit de responsabilidade democrática, a legitimidade da arbitragem repousa na sua base consensual e não impede a atuação dos órgãos de controle (ex.: tribunais de contas, Ministérios Público).

 Com efeito, as vantagens da arbitragem superam as críticas. Além da compatibilidade formal e material com a juridicidade, a utilização da arbitragem nas relações jurídico-administrativas apresenta diversas vantagens, tais como: a) celeridade e flexibilidade procedimental: prazos reduzidos, limitação de recursos e possibilidade de fixação das regras procedimentais pelas partes (arts. 21, 23 e 30 da Lei de Arbitragem); e b) tecnicidade, especialização e confiabilidade: a decisão arbitral possui maior potencial de aceitabilidade pelas partes, que indicaram os árbitros de sua confiança, com elevado conhecimento técnico (jurídico e/ou extrajurídico) sobre o assunto objeto do julgamento (art. 13 da Lei de Arbitragem).

  1. Desafios na utilização da arbitragem nos contratos da Administração Pública após a Lei 13.129/2015

            Não obstante os avanços trazidos pela Lei 13.129/2015 e pela Lei 14;133/2021, que afastam a polêmica da utilização da arbitragem pela Administração, é preciso destacar que o legislador deixou diversas questões em aberto, especialmente no tocante ao procedimento arbitral, como será demonstrado nos tópicos seguintes.

4.1. Arbitrabilidade subjetiva (Administração Pública) e objetiva (direitos disponíveis)

A arbitrabilidade, que significa a possibilidade de um litígio ser submetido à arbitragem voluntária, pode ser dividida em duas espécies: a) subjetiva (ratione personae): refere-se às pessoas que podem se submeter à arbitragem e b) objetiva (ratione materiae): diz respeito às questões que podem ser decididas por meio da arbitragem.[25]

Em relação à arbitrabilidade subjetiva, o art. 1º da Lei de Arbitragem sempre permitiu a sua utilização por pessoas capazes, regra que foi repetida no art. 851 do Código Civil.

Atualmente, o art. 1º, § 1º, da Lei de Arbitragem, alterado pela Lei 13.129/2015, estabeleceu, de forma expressa, a possibilidade de utilização da arbitragem pela Administração Pública Direta e Indireta (arbitrabilidade subjetiva) para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis (arbitrabilidade objetiva).  De forma semelhante, o art. 151 da Lei 13.133/2021 admitiu a arbitragem nas contratações realizadas pela Administração Pública.

Desta forma, no tocante à arbitrabilidade subjetiva, as pessoas jurídicas de direito público (entes da Federação, autarquias e fundações estatais de direito público) e as pessoas jurídicas de direito privado (empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações estatais de direito privado) podem prever a arbitragem como forma de solução de suas controvérsias.

Quanto à arbitrabilidade objetiva, as questões submetidas à arbitragem devem envolver direitos patrimoniais disponíveis, na forma do art. 1º, § 1º, da Lei de Arbitragem, alterado pela Lei 13.129/2015, e do art. 151, parágrafo único da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações).[26] Trata-se, a nosso ver, de assunto inerente às contratações administrativas, uma vez que o contrato é o instrumento que encerra a disposição, pela Administração, da melhor forma de atender o interesse público.

Destarte, as questões que podem ser objeto da contratação administrativa são, em princípio, disponíveis, passíveis de submissão à arbitragem.[27]

4.2. Arbitragem de direito e a vedação da arbitragem por equidade

Quanto aos critérios de julgamento, a arbitragem pode ser dividida em duas espécies: a) arbitragem de direito e b) arbitragem por equidade.

Nas questões envolvendo a Administração Pública, a arbitragem tem que ser de direito e não por equidade, conforme expressamente previsto no art. 2.º, § 3.º, da Lei 9.307/1996 e no art. 152 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações).

Trata-se de exigência respaldada no princípio da legalidade, mas é oportuno destacar que, especialmente no campo das arbitragens internacionais, a utilização de critérios extralegais (costumes, equidade etc) é comum na solução das controvérsias, o que é corroborado pelo a art. 2.º, § 2.º, da Lei 9.307/1996.

Nesse ponto, seria oportuno que a legislação mencionasse expressamente a possibilidade de aplicação dos usos, costumes, equidade e regras internacionais do comércio nas arbitragens internacionais envolvendo a Administração Pública Direta e Indireta.[28]

 

4.3. A publicidade da arbitragem na Administração Pública

A arbitragem na Administração Pública deve respeitar o princípio da publicidade, na forma do art. 37, caput, da CRFB; do art. 2.º, § 3.º, da Lei 9.307/1996, alterada pela Lei 13.129/2015; e do art. 152 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações).

Saliente-se, ainda, que a publicidade e a transparência na atuação administrativa são fundamentais para efetividade do controle social (sociedade civil) e institucional (Procuradorias estatais, Ministério Público, Tribunais de Contas etc).

Conforme destacado anteriormente, a confidencialidade[29] do procedimento arbitral cede espaço para publicidade, inerente aos processos envolvendo a Administração Pública, o que não impede o sigilo em situações excepcionais, quando houver em risco a segurança da sociedade ou do Estado ou informações pessoais relacionadas à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas.[30]

O dever de publicidade incumbe, em princípio, à Administração Pública, que deverá promover a divulgação dos atos relacionados à arbitragem. Trata-se da publi­cidade ativa, com a divulgação das informações, independentemente de solicitação de interessados. A instituição privada especializada, que administra o procedimento arbitral, é mera prestadora de serviço e, por consequência, na qualidade de contratada, não teria obrigação de dar publicidade aos atos do procedimento arbitral, mediante publicação em Diário Oficial. A definição da questão da publicidade (ativa e passiva), contudo, pode ser disciplinada nos respectivos regulamentos de arbitragem. [31]

 

4.4. Regulamentação e autonomia federativa

É importante ressaltar, desde logo, que o manejo da arbitragem para resolução de controvérsias contratuais envolvendo a Administração decorre diretamente da Lei de Arbitragem e, portanto, não está condicionada à regulamentação.[32]

A desnecessidade de regulamentação para implementação da arbitragem nas relações administrativas não afasta, contudo, a pertinência da edição de normas regulamentares, especialmente pelo fato de que a Lei de Arbitragem, alterada pela Lei 13.129/2015, deixou de abordar diversas questões que podem ser especificadas ou detalhadas no campo regulamentar tais como: viabilidade de compromisso arbitral e desnecessidade de previsão no edital/contrato; relativização de prerrogativas processuais; utilização da arbitragem ad hoc ou institucional; arbitragem monocrática ou colegiado arbitral; (des)necessidade de licitação para escolha do árbitro ou instituição arbitral; dentre outras questões.

Além da possibilidade de edição de decretos federais sobre o tema (ex.: Decreto 10.025/2019 que dispõe sobre arbitragem no setor portuário), abre-se a possibilidade para edição de normas específicas estaduais, distritais e municipais sobre a matéria (ex.: Lei 19.477/2011, do Estado de Minas Gerais; Decreto 46.245/2018, do Estado do Rio de Janeiro; Decreto 64.356/2019, do Estado de São Paulo), desde que respeitem as normas gerais da Lei de Arbitragem, uma vez que a arbitragem, nos contratos da Administração, envolve matéria inserida na competência legislativa concorrente dos Entes da federação.

4.5. Cláusula compromissória e compromisso arbitral 

De acordo com o disposto no art. 3º da Lei de Arbitragem, a convenção de arbitragem é gênero que se divide em duas espécies: a) cláusula compromissória: “convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato” (art. 4º);[33] e b) compromisso arbitral: “convenção através da qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial” (art. 9º).

Na primeira hipótese, a cláusula arbitral será inserida no edital e na minuta do contrato administrativo. Na segunda hipótese, mesmo ausente a previsão de arbitragem na avença, as partes, em comum acordo, submeterão a controvérsia contratual à arbitragem.

A cláusula compromissória se divide em duas categorias: a) cláusula compromissória cheia: opção pela arbitragem, com a definição prévia das questões relacionadas à instituição e ao procedimento arbitral (art. 5º da Lei de Arbitragem); e b) cláusula compromissória vazia (ou em branco): apenas define a submissão do contrato à arbitragem, sem qualquer definição ou detalhamento sobre a instituição e as características do procedimento arbitral.

Mencione-se, ainda, a possibilidade de pactuação da denominada cláusula escalonada, que determina a tentativa de solução da controvérsia por meio da mediação antes da instauração da arbitragem (cláusula med-arb) ou durante o procedimento arbitral (cláusula arb-med). Com isso, prestigia-se a autocomposição dos conflitos, por meio da mediação, inclusive nas hipóteses em que as partes pactuaram a arbitragem.

A partir da classificação acima, verifica-se que o problema da cláusula vazia é a impossibilidade de instauração imediata da arbitragem para resolver o conflito, pois inexistentes os elementos mínimos para o procedimento arbitral, o que pode ensejar, inclusive, a propositura de ação judicial para definição da forma de instituição do juízo arbitral (arts. 6º e 7º da Lei de Arbitragem). A cláusula compromissória cheia, por esta razão, garante maior celeridade ao procedimento, o que demonstra a sua utilização preferencial nos contratos administrativos.

Não há consenso quanto à juridicidade de submissão de controvérsias contratuais ao compromisso arbitral, sem previsão, portanto, de cláusula arbitral no edital de licitação e no contrato.

Existe o argumento de que o compromisso arbitral poderia acarretar vantagem ao contratado, que não foi disponibilizada no momento da realização da licitação aos demais interessados, o que violaria o princípio da impessoalidade.[34]

Todavia, tem prevalecido a juridicidade do compromisso arbitral nos contratos da Administração Pública, sob o argumento de que a resolução de controvérsias contratuais, envolvendo direitos disponíveis, deve ser pautada pela melhor solução em cada caso concreto.[35] Ora, se é possível a resolução consensual de questões contratuais, inclusive com a celebração de acordos, com maior razão deve ser admitida a escolha, pelas partes, da alternativa arbitral.

Ademais, a Lei de Arbitragem, ao tratar da Administração Pública, utilizou a expressão genérica “convenção de arbitragem” (art. 1º, §2º, da Lei de Arbitragem), gênero que inclui a cláusula e o compromisso arbitral, sendo certo que a forma arbitral de solução de controvérsias decorre diretamente da lei e deve ser considerada pelos interessados que participam da licitação.[36] Importante mencionar, ainda, que o art. 153 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações) permite a celebração de termos aditivos para inclusão dos meios alternativos de resolução de controvérsias nos contratos administrativos.

Sustentamos, por isso, que o compromisso arbitral pode ser utilizado para solução de controvérsias administrativas. Todavia, revela-se interessante e conveniente a estipulação prévia de cláusula arbitral cheia nos editais e contratos administrativos, especialmente nos contratos de maior vulto e complexidade, em razão da maior celeridade ao procedimento, sem olvidar a maior facilidade de definição da forma de solução de controvérsias antes da própria existência do conflito.[37]

4.6. Arbitragem e a relativização prerrogativas administrativas

A estipulação de cláusula exorbitantes nos contratos da Administração não obsta a utilização da arbitragem. Nesse caso, o árbitro decidirá sobre os efeitos patrimoniais oriundos da efetivação das referidas cláusulas.[38]

É possível apontar, contudo, uma importante limitação à utilização das prerrogativas administrativas nos contratos que possuam convenção de arbitragem. Trata-se da impossibilidade de alteração unilateral com o objetivo específico de excluir, modificar ou anular a própria cláusula arbitral, uma vez que a previsão da arbitragem na contratação pública é fator determinante para participação de empresas e fixação dos valores das propostas nas licitações públicas, bem como pelo fato de que a decisão sobre a validade da referida cláusula é atribuição do próprio Tribunal Arbitral, na forma do art. 8º, parágrafo único, da Lei de Arbitragem, que consagra o princípio “competência-competência”.[39]

Ademais, algumas prerrogativas reconhecidas à Fazenda Pública não se aplicam ao processo arbitral, senão vejamos:

  1. a) inaplicabilidade dos prazos diferenciados (art. 183 do CPC/2015) ao processo arbitral: o procedimento arbitral é definido pelas partes na convenção de arbitragem ou, de forma supletiva ou por delegação das partes, pelo árbitro ou tribunal arbitral, na forma do art. 21 da Lei de Arbitragem.
  2. b) ausência de reexame necessário (art. 496 do CPC/2015) na arbitragem: não há previsão de duplo grau e de recursos no processo arbitral, que é desenvolvido em única instância e a decisão arbitral não está sujeita à homologação judicial (art. 18 da Lei de Arbitragem).
  3. c) Ausência de isenção relativa à taxa judiciária, custas ou emolumentos na arbi­tragem: os valores devidos ao Tribunal Arbitral e aos árbitros devem ser suportados pelas partes em razão dos serviços prestados, sendo oportuno ressaltar que, no próprio processo judicial, a Fazenda Pública fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito, na forma da Súmula 232 do STJ. Cabe esclarecer, no entanto, que a Administração Pública, por meio de seus respectivos atos normativos ou das cláusulas compromissórias, tem estabelecido o dever de adiantamento das custas e das despesas da arbitragem ao contratado/particular, independentemente da iniciativa para instauração do procedimento arbitral.[40] A imposição do dever de adiantamento ao contratado na hipótese de instauração da arbitragem pelo ente público pode gerar prejuízo à economicidade da contratação pública, uma vez que o particular incluirá os potenciais riscos e custos na precificação de sua proposta. De mais a mais, se o con­tratado se recusar a efetuar o pagamento da taxa de administração ou dos honorários dos árbitros, quando da deflagração do procedimento arbitral pela Administração Pública, nada poderá ser exigido dele. A arbitragem será suspensa ou mesmo extinta, de modo que a referida previsão nos parece inócua. Em determinados casos, a res­ponsabilidade pelo dever de adiantamento das custas e despesas é imputada à parte que requereu a instauração do procedimento arbitral, o que não impede a estipulação de forma diversa por acordo entre as partes.[41] Talvez a dinâmica mais adequada para incentivar a cooperação processual e a boa-fé seja a divisão igualitária entre o Poder Público e o particular na antecipação dos custos do procedimento arbitral.[42]
  4. d) Incompatibilidade da aplicação automática das regras relacionadas à fixação do valor dos honorários de sucumbência no processo judicial (art. 85, § 3º, do CPC/2015) ao processo arbitral, salvo disposição em contrário: na ausência de previsão contratual ou regulamentar, não há que se falar na condenação da parte vencida em honorários sucumbenciais, por falecer jurisdição aos árbitros para tanto. A questão como um todo, no entanto, pode ser disciplinada de forma distinta no compromisso arbitral, no regulamento da entidade arbitral (na hipótese de arbitragem institucional) ou em norma específica do Ente Federado que integra a arbitragem, uma vez que a Lei de Arbitragem não dispõe sobre o tema de forma peremptória. Diversos atos normativos, no bojo da Administração Pública, têm determinado a aplicação do art. 85 do CPC na fixação dos honorários sucumbenciais, com a exclusão dos honorários contratuais.[43]
  5. e) inaplicabilidade do regime do precatório ou da requisição de pequeno valor: a arbitragem revela procedimento extrajudicial de solução de controvérsias, inexistindo, portanto, “sentença judiciária” (art. 100 da CRFB). Assim como ocorre nos pagamentos espontâneos de valores relativos aos contratos e acordos em geral, que não decorram de sentença judicial, o pagamento do valor definido na arbitragem independe de precatório, salvo se houver necessidade de execução judicial da decisão arbitral condenatória, que possui natureza jurídica de título executivo extrajudicial (art. 31 da Lei de Arbitragem).[44] Contudo, diversos decretos regulamentares têm estabelecido a submissão ao regime do precatório nas condenações arbitrais de pessoas jurídicas de direito público da Administração Pública.[45]

4.7. Arbitragem ad hoc ou institucional

A Lei de Arbitragem, alterada pela Lei 13.129/2015, e a Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações) não trataram sobre a necessidade de instituição de arbitragem ad hoc ou institucional, o que, em princípio, confere discricionariedade ao administrador público para escolha por um desses caminhos em cada caso concreto.

Enquanto na arbitragem ad hoc (ou arbitragem avulsa) o procedimento é definido pelas partes e/ou pelos árbitros, na arbitragem institucional (ou arbitragem administrada) as regras procedimentais encontram-se previamente definidas por determinada câmara arbitral.

A arbitragem ad hoc teria, de um lado, a vantagem de reduzir custos, uma vez que não haveria a necessidade de contratação de instituição privada (câmara de arbitragem) para prestação de serviços, mas, de outro lado, a desvantagem de acarretar insegurança para as partes, com a maior probabilidade de impasses na definição e nas questões cotidianas inerentes ao procedimento arbitral (exs.: escolha da infraestrutura e dos recursos humanos para os serviços de secretaria; definição dos valores dos honorários dos árbitros e forma de pagamento; indefinição na escolha do árbitro presidente quando houver impasse na entre os coárbitros indicados pelas partes; etc.), o que pode frustrar e/ou retardar a solução da controvérsia, bem como a propositura de ações judiciais para resolução de impasses.[46]

Não obstante a discricionariedade administrativa na definição do tema, entendemos que o ideal seria a utilização da arbitragem institucional, com a escolha de Câmara de Arbitragem já existente, com experiência e reconhecida pela comunidade jurídica, o que garante, em tese, maior segurança jurídica às partes. Além disso, a Câmara de Arbitragem tem a vantagem de contar com regulamento próprio e prestar serviços de secretaria às partes, com a elaboração de documentos, recebimentos das manifestações, realização de audiências e outros atos que serão praticados ao longo do procedimento.[47]

4.8. Árbitro ou tribunal arbitral

Na arbitragem, a controvérsia pode ser decidida por árbitro único ou por tribunal arbitral (três ou mais árbitros, sempre em número ímpar).

Apesar da questão não ser abordada na Lei 9.307/1996 e na Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações), entendemos que a arbitragem, que envolve a Administração Pública, não deve ser submetida, em regra, à arbitragem monocrática, mas ao colegiado arbitral, formado, por no mínimo, três árbitros.

Isto porque o debate por árbitros integrantes de colegiado arbitral tem maior potencial de qualificar a decisão a ser proferida, que, enfatize-se, não será submetida à revisão superior. O colegiado arbitral conferiria, portanto, maior legitimidade à decisão.

É recomendável que os Entes federados, em suas normas específicas, estabeleçam, preferencialmente, a utilização de colegiados arbitrais ao invés de árbitros isolados para solução de litígios oriundos de contratações administrativas, notadamente nos casos de grande vulto econômico.[48]

4.9. Escolha do árbitro ou instituição arbitral: inexigibilidade de licitação

Questão interessante envolve a necessidade ou não de licitação para contratação do árbitro e/ou do tribunal arbitral.

Inicialmente, é preciso destacar que o objeto da contratação possui grau de incerteza, seja na própria execução do serviço, que depende do surgimento da controvérsia contratual, seja no valor devido, que pode variar de acordo com a extensão da controvérsia que será submetida ao juízo arbitral, vulto econômico e/ou complexidade técnica.

Ademais, no tocante à arbitragem institucional, cada Câmara de Arbitragem possui regulamento próprio, com regras sobre o procedimento arbitral, bem como listagem de árbitros indicados às partes e tabelas de taxas administrativas, honorários de árbitros e outras despesas, o que demonstra a existência de variáveis que justificariam, em tese, a ausência de licitação.[49]

Outro fator determinante para escolha da Câmara Arbitral é a sua reputação, questão que envolve subjetividade incompatível com o processo de licitação.

Além da contratação da Câmara de Arbitragem, o Poder Público deve indicar o árbitro, cuja notória especialização, aliada à singularidade do caso, justificaria a inexigibilidade de licitação.

Na hipótese de arbitragem submetida à análise de árbitro monocrático, a manifestação de vontade do Poder Público não seria suficiente, pois dependeria da concordância da outra parte. Ou seja: o Poder Público e a sociedade empresária, que estão em conflito, contrariam o árbitro. Não se trata, portanto, de contrato tipicamente administrativo, mas de contrato celebrado pelo Poder Público e a sociedade empresária interessada, de um lado, e o árbitro, como contratado, de outro lado.

Em relação à arbitragem submetida ao colegiado arbitral, a Administração Pública não tem o poder de estabelecer, isoladamente, todos os aspectos do objeto contratado. Isto porque a escolha do presidente do colegiado arbitral será realizada, normalmente, pelos dois árbitros indicados, cada um, pelas partes interessadas.

Em qualquer caso, a licitação seria inconveniente para o atendimento célere e eficiente do interesse público. De lado a impertinência de licitação para contratação da arbitragem antes da existência da controvérsia, que revelaria a realização de despesas públicas para objeto futuro e incerto (a realização do certame, por si só, envolve custos), certo é que a realização da licitação, após a instauração da controvérsia, também teria o inconveniente de gerar morosidade para instituição da arbitragem e, portanto, para solução da questão.

Constata-se, com isso, que a contratação da Câmara e do árbitro envolve singularidade e indefinição quanto à prestação exata do serviço. A inexistência de critérios objetivos para escolha de árbitros e de Câmaras distintas, com regulamentos arbitrais próprios, revela inviabilidade de competição.

As contratações dos árbitros e das câmaras arbitrais, em síntese, não se submetem à licitação, em razão da inexigibilidade de licitação que encontra fundamento no art. 25, caput e inciso II, da Lei 8.666/1993.[50] Aliás, o art. 154 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações) reforça a tese da inexigibilidade de licitação ao  dispor que o processo de escolha dos árbitros, dos colegiados arbitrais e dos comitês de resolução de disputas observará critérios isonômicos, técnicos e transparentes.

É recomendável, nesse cenário, a utilização do credenciamento (ou cadastramen­to) por parte da Administração Pública. Após o cumprimento dos requisitos básicos e proporcionais, fixados pela Administração, todas as instituições arbitrais poderiam realizar o credenciamento perante o Poder Público. Nesse caso, a escolha da institui­ção arbitral credenciada seria realizada, em cada caso, pelo particular interessado na resolução da disputa.[51]

Lembre-se que o credenciamento não pressupõe a realização de licitação (art. 25, caput, da Lei 8.666/1993 e art. 74, IV, da Lei 14.133/2021). A partir de condições previamente estipuladas por regulamento do Poder Público para o exercício de determinada atividade, todos os interessados que preencherem as respectivas condições serão credenciados e poderão prestar os serviços. Não há, portanto, competição entre interessados para a escolha de um único vencedor.[52]

  1. Conclusões

            A juridicidade da utilização da arbitragem nos contratos da Administração Pública foi consagrada, definitivamente, pela Lei de Arbitragem, alterada pela Lei 13.129/2015 e pela Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações).

Entretanto, diversas questões permanecem em aberto, o que revela a conveniência de fixação de parâmetros pela doutrina e pelas normas regulamentadoras que serão editadas pelos entes federados, com o objetivo de reduzir incertezas e garantir maior segurança jurídica no manejo da arbitragem por parte da Administração Pública.

Por esta razão, o presente ensaio apresentou e discutiu os principais desafios enfrentados nas arbitragens utilizadas nas contratações públicas, com o objetivo de conciliar essa importante forma de resolução extrajudicial de conflitos com os princípios da Administração Pública.

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[1] Sobre a distinção entre mediação e conciliação, vide: ˂http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/conciliacao-mediacao˃. Acesso em: 02/06/2015. Em razão da importância da autocomposição de conflitos, o CNJ editou a Resolução 125/2010 que dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário e prevê a oferta pelos órgãos judiciários de mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação. Destaque-se, ainda, a instituição da Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal (CCAF), no âmbito da Advocacia-Geral da União (AGU), que tem procurado reduzir a litigiosidade entre órgãos e entidades administrativas.

[2] A previsão da arbitragem no ordenamento jurídico é antiga, cabendo mencionar, exemplificativamente: Constituição/1824 (art. 160); Código Comercial/1850; Decreto 3.084/1898; Código Civil/1916 (arts. 1.037/1.048); DL 2.300/1986 (art. 45); Código de Processo Civil/1973 (arts. 1.072/1.102); Constituição/1988 (art. 114, §1º); Lei 9.307/1996 (Lei de Arbitragem); Código Civil/2002 (arts. 851/853); Código de Processo Civil/2015 (art. 3º, §1º).

[3] BOLZAN DE MORAIS, José Luis; SPENGLER, F. M.. Mediação e arbitragem: alternativas a jurisdição. 2. ed.. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008. p. 183.

[4] CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e Processo: um comentário à Lei nº 9.307/96, 2. ed., São Paulo: Atlas, 2004. p. 45; Theodoro Júnior, Humberto. A arbitragem como meio de solução de controvérsias. In: Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, n. 2, nov./dez., 1999, p. 12.

[5] CÂMARA, Alexandre de Freitas. Arbitragem: Lei nº9.307/96, Rio de Janeiro:  Lumen Juris, 4. ed., 2005. p. 12-15.

[6] Sobre o tema, vide: WALD, Arnoldo. A arbitragem contratual e os dispute boards. In: Revista de Arbitragem e Mediação, v. 2, n. 6, 9-24, jul./set. 2005; VAZ, Gilberto José. NICOLI, Pedro Augusto Gravatá. Os Dispute Boards e os contratos administrativos: são os DBs uma boa solução para disputas sujeitas a normas de ordem pública? In: Revista de Arbitragem e Mediação, v. 10, n. 38, p. 131–147, jul./set., 2013. Na forma do regulamento da International Chamber of Commerce (ICC), existem três tipos de dispute boards: a) Dispute Review Boards (DRBs): emitem recomendações sobre determinada controvérsia, sem caráter vinculante imediato; b) Dispute Adjudication Boards (DABs): decidem as controvérsias contratuais, com caráter vinculante; e c) Combined Dispute Boards (CDBs): emitem recomendações e, em determinados casos, decidem disputas contratuais. Fonte: ˂http://www.iccwbo.org/products-and-services/arbitration-and-adr/dispute-boards/dispute-board-rules/#article_4˃. Acesso em: 02/06/2015.

[7] Mencione-se, por exemplo, a utilização do dispute board na construção da linha amarela do Metrô de São Paulo. De forma pioneira, o Município tratou do dispute board nas contratações públicas na Lei Municipal 16.873/2018, regulamentada pelo Decreto Municipal 60.067/2021. Antes da promulgação da nova Lei de Licitações, a utilização foi formalmente reconhecida na I Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/CJF), realizada em 2016. Naquele encontro, foram aprovados três enunciados que tratam especificamente do tema: Enunciado 49 – “Os Comitês de Resolução de Disputas (Dispute Boards) são um método de solução consensual de conflito, na forma prevista no parágrafo 3º do art. 3º do CPC.” Enunciado 76 – “As decisões proferidas por um Comitê de Resolução de Disputas (Dispute Board), quando os contratantes tiverem acordado pela sua adoção obrigatória, vinculam as partes ao seu cumprimento até que o Poder Judiciário ou o juízo arbitral competente emitam nova decisão ou a confirmem, caso venham a ser provocados pela parte inconformada.” Enunciado 80 – “A utilização de Comitês de Resolução de Disputas (Dispute Boards), com a inserção da respectiva cláusula contratual, é recomendável para os contratos de construção ou de obras de infraestrutura, como mecanismo voltado para a prevenção de litígios e a redução dos custos correlatos, permitindo a imediata resolução de conflitos surgidos no curso da execução dos contratos.” Em 2020, o Enunciado 19 da I Jornada de Direito Administrativo realizada pelo CEJ/CJF reafirmou a possibilidade de utilização dos métodos adequados de

resolução de controvérsias nas contratações públicas, incluindo o dispute board: “As controvérsias acerca de equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos integram a categoria das relativas a direitos patrimoniais disponíveis, para cuja solução se admitem meios extrajudiciais adequados de prevenção e resolução de controvérsias, notadamente a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas e a arbitragem.”

[8] STF, SE 5.206 AgR/EP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, DJ 30/04/2004, p. 29 (Informativo de Jurisprudência do STF 254).

[9] STF, AI 52.181/GB, Rel. Min. Bilac Pinto, Tribunal Pleno, DJ 15/02/1974, p. 720.

[10] STJ, REsp 612.439/RS, rel. Min. João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ 14/09/2006, p. 299; STJ, MS 11.308/DF, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Seção, DJe 19/05/2008.

[11] TCU, Decisão 286/1993, Plenário, rel. Min. Homero Santos, Dou 04/08/1993; TCU, Acórdão 587/2003, Plenário, rel. Min. Adylson Motta, DOU 10/06/2003; TCU, Acórdão 906/2003, Plenário, rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha, DOU 24/07/2003; TCU, Acórdão 1099/2006, Plenário, rel. Min. Augusto Nardes, DOU 10/07/2006. O Tribunal, posteriormente, admitiu a arbitragem nos contratos celebrados por sociedade de economia mista (Petrobras), versando exclusivamente sobre “a resolução dos eventuais litígios a assuntos relacionados à sua área-fim e a disputas eminentemente técnicas oriundas da execução dos aludidos contratos”. TCU, Acórdão 2094/2009, rel. Min. José Jorge, DOU 11/09/2009. Todavia, nessa última hipótese, os contratos não seriam administrativos propriamente ditos, mas privados da administração e, portanto, submetidos, naturalmente, ao direito privado.

[12] Registre-se que a PEC 29, que se transformou na EC 45/2004, chegou a prever a proibição de utilização da arbitragem por entidades de direito público, mas a vedação não foi aprovada e inserida na redação final da Emenda.

[13] GIANNINI, Massimo Severo. Derecho administrativo. Madrid: MAP, 1991. v. I, p. 111.

[14] Sobre o princípio da juridicidade, vide: OTERO, Paulo. Legalidade e Administração Pública: o sentido da vinculação administrativa à juridicidade. Coimbra: Almedina, 2003; ZAGREBELSKY, Gustavo. El derecho dúctil. Ley, derechos, justicia, Madrid: Trotta, 2003. p. 39-40; MERKL, Adolfo. Teoría general del Derecho Administrativo. Granada: Comares, 2004. p. 206; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. A constitucionalização do direito administrativo: o princípio da juridicidade, a releitura da legalidade administrativa e a legitimidade das agências reguladoras. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010; MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 87.

[15] OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Licitações e contratos administrativos, 5. ed., São Paulo: Método, 2015. p. 255-257.

[16] A exigência contida art. 55, § 2º da Lei 8.666/1993 é afastada nos seguintes casos: a) licitações internacionais para a aquisição de bens e serviços cujo pagamento seja feito com o produto de financiamento concedido por organismo financeiro internacional de que o Brasil faça parte, ou por agência estrangeira de cooperação; b) contratação com empresa estrangeira, para a compra de equipamentos fabricados e entregues no exterior, desde que para este caso tenha havido prévia autorização do chefe do Poder Executivo; e c) aquisição de bens e serviços realizada por unidades administrativas com sede no exterior (art. 32, § 6.º c/c o art. 55, § 2.º, ambos da Lei 8.666/1993).

[17] SUNDFELD, Carlos Ari; CÂMARA, Jacintho Arruda. O cabimento da arbitragem nos contratos administrativos. In: RDA n. 248, mai./ago., 2008, p. 123; CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e Processo: um comentário à Lei 9.307/96. 3ª ed., São Paulo: Atlas, 2009. p. 48-49; SALLES, Carlos Alberto de. Arbitragem em Contratos Administrativos, Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 245.

[18] SILVA, Vasco Manuel Pascoal Dias Pereira da. Em busca do acto administrativo perdido, Coimbra: Almedina, 2003, p. 40

[19] ESTORNINHO, Maria João. A fuga para o direito privado: contributo para o estudo da actividade de direito privado da Administração Pública, Coimbra: Almedina, 1999, p. 44.

[20] Aliás, é tradicional a distinção entre interesse público primário e secundário. No primeiro caso, o interesse público relaciona-se com a necessidade de satisfação de necessidades coletivas (justiça, segurança e bem-estar) por meio do desempenho de atividades administrativas prestadas à coletividade (serviços públicos, poder de polícia, fomento e intervenção na ordem econômica). No segundo caso, o interesse público é o interesse do próprio Estado, enquanto sujeito de direitos e obrigações, ligando-se fundamentalmente à noção de interesse do erário, implementado por meio de atividades administrativas instrumentais necessárias para o atendimento do interesse público primário, tais como as relacionadas ao orçamento, aos agentes público e ao patrimônio público. Os adeptos da dicotomia costumam afirmar a supremacia e indisponibilidade do interesse público primário, mas não do secundário. ALESSI, Renato. Sistema istituzionale del diritto amministrativo italiano. 2. ed. Milão: Giuffrè, 1960. p. 197. Sobre a discussão atual e releitura do princípio da supremacia do interesse público, vide: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo. 3. ed. São Paulo: Método, 2015. p. 35-38.

[21] De forma semelhante, vide: TEPEDINO, Gustavo. Consensualismo na arbitragem e teoria do grupo de sociedades. In: Revista Forense n. 903, Rio de Janeiro, RT, 2011. p. 9-26.

[22] Segundo Eros Grau, após afirmar que não há qualquer correlação entre disponibilidade ou indisponibilidade de direitos patrimoniais e disponibilidade ou indisponibilidade do interesse público conclui: “Daí porque, sempre que puder contratar, o que importa disponibilidade de direitos patrimoniais, poderá a Administração, sem que isso importe disposição do interesse público, convencionar cláusula de arbitragem”. GRAU, Eros. Arbitragem e contrato administrativo. In: RTDP, 32, São Paulo: Malheiros, 2000, p. 20.

[23] Alguns autores, como José Emilio Nunes Pinto, sustentam que o princípio da publicidade determinaria apenas o envio de informações sobre o andamento do procedimento arbitral, envolvendo a Administração, aos órgãos de controle interno e externo. PINTO, José Emilio Nunes. A confidencialidade na arbitragem. In: Revista de Arbitragem e Mediação, n. 6. São Paulo: Revista dos Tribunais, jul./set., 2005. p. 25-36.

[24] Sobre as vantagens e desvantagens da arbitragem, vide: CORREIA, J. M. Sérvulo. A arbitragem dos litígios entre particulares e Administração Pública sobre situações regidas pelo Direito Administrativo. In: Revista de Contratos Públicos, Belo Horizonte, n. 5, set. 2014/fev. 2015, p. 177-184.

[25] OLIVEIRA, Ana Perestrelo de. Arbitragem de litígios com entes públicos. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2015. p. 11-12.

[26] O art. 151, parágrafo único, da Lei 14.133/2021 prevê: “Será aplicado o disposto no caput deste artigo às controvérsias relacionadas a direitos patrimoniais disponíveis, como as questões relacionadas ao restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ao inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das partes e ao cálculo de indenizações.” De acordo com o art. 852 do Código Civil dispõe: “É vedado compromisso para solução de questões de estado, de direito pessoal de família e de outras que não tenham caráter estritamente patrimonial”.

[27] De forma semelhante: SUNDFELD, Carlos Ari; CÂMARA, Jacintho Arruda. O cabimento da arbitragem nos contratos administrativos. In: RDA n. 248, mai./ago., 2008, p. 120. Nos setores rodoviário, ferroviário e aeroportuário da administração pública federal, por exemplo, o art. 31, § 4º, da Lei 13.448/2017, que dispõe sobre a prorrogação e relicitação dos contratos de parceria, considera como integrantes do conceito de “direitos patrimo­niais disponíveis” as seguintes questões: a) as questões relacionadas à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos; b) o cálculo de indenizações decorrentes de extinção ou de transferência do contrato de concessão; e c) o inadimplemento de obrigações contratuais por qualquer das partes. O art. 2º, parágrafo único, do Decreto Federal 10.025/2019 menciona, exemplificativamente, as seguintes controvérsias: a) questões relacionadas à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos; b) cálculo de indenizações decorrentes de extinção ou de transferência do contrato de parceria; e c) inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das partes, incluídas a incidência das suas penalidades e o seu cálculo. No Estado do Rio de Janeiro, por sua vez, o art. 1º, parágrafo único, do Decreto 46.245/2018 insere nos conflitos relacionados a direitos patrimoniais disponíveis as controvérsias que possuam natureza pecuniária e que não versem sobre interesses públicos primários. O Enunciado 13 da I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios do CEJ/CJF dispõe: “Podem ser objeto de arbitragem relacionada à Administração Pública, dentre outros, litígios relativos: I – ao inadimplemento de obrigações contratuais por qualquer das partes; II – à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, cláusulas financeiras e econômicas”.

[28] Nesse sentido, o Enunciado 11 da I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios do CEJ/CJF dispõe: “nas arbitragens envolvendo a Adminis­tração Pública, é permitida a adoção das regras internacionais de comércio e/ou usos e costumes aplicáveis às respectivas áreas técnicas”.

Sustentamos, em outra oportunidade, a importância da aplicação da lex mercatoria nas relações comerciais internacionais que envolvem o Estado, bem como a possibilidade de submissão à arbitragem como forma alternativa de solução de lides. OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Princípios do Direito Administrativo, 2. ed., São Paulo: Método, 2013. p. 49-50. Sobre a importância da lex mercatoria no “Direito Administrativo Global”, vide: KINGSBURY, Benedict; KRISCH, Nico; STEWART, Richard B. The emergence of Global Administrative Law. Law and Contemporany Problems, North Carolina: Duke University School of Law, v. 68, n. 3 e 4, p. 17 e 29, 2005. Nos contraltos de concessão do petróleo, por exemplo, o art. 44, VI, da Lei 9.784/1997 dispõe que o contrato estabelecerá que o concessionário estará obrigado a “adotar as melhores práticas da indústria internacional do petróleo e obedecer às normas e procedimentos técnicos e científicos pertinentes, inclusive quanto às técnicas apropriadas de recuperação, objetivando a racionalização da produção e o controle do declínio das reservas.”

[29] De acordo com Felipe Estefam, a confidencialidade não se confunde com a privacidade. Enquanto a confidencialidade diz respeito à obrigação de não divulgar informações sobre a arbitragem, “a privacidade refere-se à participação no procedimento arbitral das partes e os necessariamente envolvidos, facultando-se a participação de terceiros na medida do possível” (ESTEFAM, Felipe Faiwichow. Cláusula arbitral e administração pública. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019. p. 60). De forma semelhante, vide: GRION, Renato Stephan. Procedimento II. LEVY, Daniel; PEREIRA, Guilherme Setoguti J. (coord.). Curso de arbitragem. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018. p. 213-215.

[30] De forma semelhante, o Enunciado 4 da I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios do CEJ/CJF dispõe: “Na arbitragem, cabe à Administração Pública promover a publicidade prevista no art. 2º, § 3º, da Lei n. 9.307/1996, observado o disposto na Lei n. 12.527/2011, podendo ser mitigada nos casos de sigilo previstos em lei, a juízo do árbitro.” Em âmbito federal, o art. 3º, IV do Decreto Federal 10.025/2019 dispõe que “as informações sobre o processo de arbitragem serão públicas, ressalvadas aquelas necessárias à preservação de segredo industrial ou comercial e aquelas consideradas sigilosas pela legislação brasileira”. No Estado do Rio de Janeiro, o Decreto 46.245/2018 dispõe: “Art. 13 – Os atos do processo arbitral serão públicos, ressalvadas as hipóteses legais de sigilo, de segredo de justiça, de segredo industrial decorrentes da exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou entidade privada que tenha qualquer vínculo com o Poder Público. § 1º – Para fins de atendimento deste dispositivo, consideram-se atos do processo arbitral as petições, os laudos periciais e as decisões dos árbitros de qualquer natureza”. O Decreto 64.356/2019 do Estado de São Paulo prevê: “artigo 12 – Os atos do procedimento arbitral serão públicos, ressalvadas as hipóteses legais de sigilo ou segredo de justiça. § 1º – Para fins de atendimento deste dispositivo, consideram-se atos do procedimento arbitral as petições, laudos periciais, Termo de Arbitragem ou instrumento congênere e decisões dos árbitros”.

[31] SCHMIDT, Gustavo da Rocha; FERREIRA, Daniel Brantes; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Comentários à lei de arbitragem, Rio de Janeiro: Método, 2021, p. 28-29.

 Arbitragem na administração pública. Curitiba: Juruá, 2018. p. 59. Em âmbito federal, o art. 3º, § 1º, do Decreto 10.025/2019 dispõe que, salvo con­venção entre as partes, caberá à câmara arbitral fornecer o acesso às informações. Por outro lado, o art. 13, § 2º, do Decreto 46.245/2018 Estado do Rio de Janeiro dispõe que a Procuradoria-Geral do Estado disponibilizará os atos do processo arbitral mediante requerimento de eventual interessado. No Estado de São Paulo, o art. 12, § 2º, do De­creto 64.356/2019 consagrou o dever de publicidade ativa (e não meramente passiva) ao impor que, independentemente de requerimento de interessados, a Procuradoria­-Geral do Estado disponibilizará os atos do procedimento arbitral na rede mundial de computadores.

[32] Registre-se que, durante a tramitação do Projeto de Lei 7.108/2014, foi debatida a necessidade de regulamentação da arbitragem para sua aplicação por parte da Administração Pública. Todavia, o texto final da proposta não contou com tal exigência, o que ratifica a aplicabilidade direta da arbitragem, independentemente de regulamentação.

[33] A cláusula compromissória se divide em duas categorias: a) cláusula compromissória cheia: opção pela arbitragem, com a definição prévia de questões relacionadas à instituição e ao procedimento arbitral; e b) cláusula compromissória vazia: apenas define a submissão do contrato à arbitragem, sem qualquer definição ou detalhamento sobre a instituição e as características do procedimento arbitral. A cláusula compromissória cheia, como se percebe, garante maior celeridade ao procedimento.

[34] TCU, Decisão 286/93, Rel. Min. Homero Santos, DOU 04/08/1993.

[35] Nesse sentido decidiu o STJ, REsp 904.813/PR,  Rel(a). Min(a). Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 28/02/2012). Da mesma forma, o Enunciado 2 da I Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios do CEJ/CJF dispõe: “Ainda que não haja cláusula compromissória, a Administração Pública poderá celebrar compromisso arbitral”. De forma semelhante: AMARAL, Paulo Osternack, Arbitragem e Administração Pública: aspectos processuais, medidas de urgência e instrumentos de controle, Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 77 e segs. A viabilidade do compromisso arbitral, quando não estipulada a cláusula compromissória, foi expressamente prevista em diversos diplomas normativos, tais como: arts. 5º ao 7º do Decreto Federal 10.025/2019; art. 3º, § 2º, do Decreto 46.245/2018 do Estado do Rio de Janeiro; art. 4º, § 3º, do Decreto 64.356/2019 do Estado de São Paulo.

[36] TALAMINI, Eduardo. Arbitragem e parceria público-privada (PPP). In: TALAMINI, Eduardo; JUSTEN, Monica Spezia (Orgs). Parcerias Publico-Privadas: um enfoque multidisciplinar, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 351.

[37] No Estado do Rio de Janeiro, a Resolução PGE 4.212/2018 aprovou a minuta-padrão de cláusula compromissória e o art. 3º, § 2º, do Decreto estadual 46.245/2018 admite o compromisso arbitral.

[38] De forma semelhante, vide: LEMES, Selma M. Ferreira. Arbitragem na Administração Pública. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 144

[39] SCHIMIDT, Gustavo da Rocha; FERREIRA, Daniel Brantes; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Comentários à lei de arbitragem, Rio de Janeiro: Método, 2021, p. 19-20. O STJ, em ação que proposta por empresa estatal para anular compromisso arbitral por ela firmado, decidiu: “A submissão da controvérsia ao juízo arbitral foi um ato voluntário da concessionária. Nesse contexto, sua atitude posterior, visando à impugnação desse ato, beira às raias da má-fé, além de ser prejudicial ao próprio interesse público de ver resolvido o litígio de maneira mais célere” (STJ, REsp 904.813/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 28.02.2012). De forma semelhante: PEREIRA, Cesar A. Arbitragem e função administrativa. In: JUSTEN FILHO, Marçal; SILVA, Marco Aurélio de Barcelos. Direito da infraestrutura: estudos de temas relevantes. Belo Horizonte: Fórum, 2019. 74-76.

[40] Nesse sentido, por exemplo: art. 11, parágrafo único, da Lei 19.477/2011 do Estado de Minas Gerais; art. 31, § 2º, da Lei 13.448/2017; art. 9º do Decreto Federal 10.025/2019.

[41] Nesse sentido, por exemplo: art. 9 º Decreto 46.245/2018 do Estado do Rio de Janeiro; art. 4º, § 1º, item 5, e art. 8º do Decreto 64.356/2019 do Estado de São Paulo.

[42] SCHIMIDT, Gustavo da Rocha; FERREIRA, Daniel Brantes; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Comentários à lei de arbitragem, Rio de Janeiro: Método, 2021, p. 21-22. De forma semelhante, vide: CRUZ, Elisa Schmidlin. A dinâmica de custeio das arbitra­gens público-privadas institucionais: compartilhamento de despesas e incentivos de cooperação. In: CUÉLLAR, Leila et al. Direito administrativo e Alternative Dispute Reso­lution: arbitragem, mediação, dispute board, mediação e negociação. Belo Horizonte: Fórum, 2020. p. 173-191.

[43] Mencione-se, por exemplo: art. 16, parágrafo único, do Decreto 46.245/2018 do Estado do Rio de Janeiro; art. 9º, § 6º, do Decreto Federal 10.025/2019; art. 4º, § 1º, do Decreto 64.356/2019 do Estado de São Paulo.

[44] Sobre o tema: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende; MAZZOLA, Marcelo. Arbitragem e Poder Público: pagamento voluntário burla o sistema de precatórios? Disponível em: <http://genjuridico.com.br/2016/12/19/arbitragem-e-poder-publico-pagamento-voluntario-burla-o-sistema-de-precatorios/>. Acesso em: 05 jan. 2019.

[45] Decreto Federal 10.025/2019: “Art. 15. Na hipótese de sentença arbitral condenatória que imponha obrigação pecuniária à União ou às suas autarquias, inclusive relativa a custas e despesas com procedimento arbitral, o pagamento ocorrerá por meio da expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o caso”. Decreto 64.356/2019 do Estado de São Paulo: “Art. 9º. As sentenças arbitrais que imponham obrigação pecuniária à Administração Pública direta e suas autarquias serão cumpridas conforme o regime de precatórios ou de obrigações de pequeno valor, nas mesmas condições impostas aos demais títulos executivos judiciais”. Decreto 46.245/2018 do Estado do Rio de Janeiro: “Art. 15. Ressalvadas as exceções previstas em lei, em caso de sentença arbitral condenatória ou homologatória de acordo que imponha obrigação pecuniária contra o Estado ou qualquer entidade com personalidade de direito público, o pagamento será efetivado mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o artigo 100 da Constituição da República”.

[46] Sobre as vantagens da arbitragem institucional em relação à arbitragem ad hoc, vide: MUNIZ, Joaquim de Paiva. Curso de direito arbitral: aspectos práticos do procedimento, 2. ed., Curitiba: CRV, 2014. p. 64; PEREIRA, Ana Lucia. A função das entidades arbitrais. In: Manual de arbitragem para advogados, CEMCA/CFOAB, 2015. p. 88-91.

[47] OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Arbitragem nos contratos da Administração Pú­blica. Revista Brasileira de Alternative Dispute Resolution – RBADR, Belo Horizonte, v. 1, n. 1, p. 99-121, jan./jun. 2019. O art. 3º, V e § 3º, do Decreto Federal 10.025/2019 e o art. 3º do Decreto 64.356/2019 do Estado de São Paulo estabelecem a preferência na utilização da arbitragem institucional, admitindo-se, de forma justificada, a utilização da arbitragem ad hoc. Nos Estados de Minas Gerais (art. 4º da Lei 19.477/2011) e do Rio de Janeiro (art. 2º do Decreto 46.245/2018), o juízo arbitral será exclusivamente exercido por meio de órgão arbitral institucional. No mesmo sentido: SCHMIDT, Gustavo da Rocha. Arbitragem na Administração Pública. Curitiba: Juruá, 2018. p. 67-68.

[48] No Estado do Rio de Janeiro, a arbitragem deve ser conduzida por Tribunal Arbitral, formado por três árbitros (parágrafo terceiro da minuta-padrão da cláusula compro­missória aprovada pela Resolução PGE 4.212/2018). No Estado de São Paulo, o art. 4º, § 1º, 6, do Decreto 64.356/2019 estabeleceu, como regra, a condução por Tribunal Arbitral composto por três membros, podendo ser escolhido árbitro único em causas de menor valor ou menor complexidade.

[49] Em sentido contrário, sustentando a necessidade de licitação para contratação da instituição arbitral, vide: FITCHNER, José Antonio. A confidencialidade no projeto da nova lei de arbitragem – PLS nº 406/2003. In: ROCHA, Caio Cesar Vieira & SALOMÃO, Luis Felipe (coordenação). Arbitragem e mediação: a reforma da legislação brasileira, São Paulo: Atlas, 2015, p. 185

[50] No mesmo sentido, o Enunciado 39 da I Jornada de Direito Administrativo realizada pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/ CJF) dispõe: “A indicação e a aceitação de árbitros pela Administração Pública não dependem de seleção pública formal, como concurso ou licitação, mas devem ser objeto de fundamentação prévia e por escrito, considerando os elementos relevantes.”. Igualmente: RIBEIRO, Maurício Portugal; PRADO, Lucas Navarro. Comentários à Lei de PPP – Parceria Público-Privada: fundamentos econômico-jurídicos, São Paulo: Malheiros, 2007. p. 291.

[51] Essa é a opinião, também, de Gustavo da Rocha Schmidt. Após sustentar a inexigibilidade de licitação, com fulcro no art. 25, II, da Lei 8.666/1993, o autor sugere a possibilidade de credenciamento. SCHMIDT, Gustavo da Rocha. Arbitragem na Administração Pública. Curitiba: Juruá, 2018.

[52] SCHMIDT, Gustavo da Rocha. Arbitragem na Administração Pública. Curitiba: Juruá, 2018. p. 69-72. A opção pelo credenciamento (ou cadastramento) das câmaras arbitrais foi reali­zada, por exemplo, nos seguintes diplomas normativos: art. 31, § 5º, da Lei 13.448/2017; art. 14 do Decreto 46.245/2018 do Estado do Rio de Janeiro; arts. 10 e 11 do Decreto Federal 10.025/2019; arts. 13 a 15 do Decreto 64.356/2019 do Estado de São Paulo.

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